Luto – tabu agora tem grupo de apoio especializado

Reuniões acontecem no Guará e ensinam como lidar com a morte de uma pessoa próxima, a solidão e a superação

“Iniciei um ciclo de palestras motivacionais, dirigidas especialmente aos pais enlutados. Ao término das palestras ministradas, atendia inúmeros pais que procuravam um alento a uma dor tão pungente, que nada se comparava ao vazio em perder o seu filho/filha”, conta Vânia.

A perda de um parente querido ou de alguém muito próximo é sem dúvida um dos piores momentos que alguém pode passar na vida. A dor de quem fica pode ser interminável caso ela não encontre o apoio necessário no chamado período de luto. Encontrar um ombro amigo, um abraço reconfortante, alguém que diga as palavras certas ou que não diga nada, apenas ouça, é imprescindível. Mas, em meio à rotina frenética da vida moderna nem sempre as pessoas estão disponíveis para dar essa atenção a quem está enlutado.
Há cerca de um ano ,o grupo Apoio a Perdas Irreparáveis – API/DF tem se reunido na QE 13 conjunto U casa 13 do Guará II, no Observatório Urbanos. Os encontros acontecem na última sexta-feira do mês a partir das 17h. Na reunião aberta À toda comunidade, cada pessoa pode contar a sua experiência na roda de conversa, onde também acontecem dinâmicas e uma palestra ministrada por profissionais da área (psicólogos, terapeutas etc) ou pessoas que tenham vivenciado sofrimento parecido. Todas as reuniões são gratuitas.

Inspiração pessoal
Entre as idealizadoras da rede de apoio está a professora Vânia Borges de Carvalho moradora do Guará há mais de 40 anos e autora do livro Pérolas do Asfalto. No livro ela conta parte da sua biografia e encerra no trágico acidente que tirou a vida do seu marido e de seus quatro filhos em 2010 no trevo da cidade de Correntina (BA).
A família seguia de carro para Fortaleza quando um veículo a 150km/h se chocou contra o carro da família de Vânia. Ambos os veículos epegaram fogo e quase todos os ocupantes morreram – apenas Vânia sobreviveu. Ela teve 70% do corpo queimado, ficou três meses internada, com diversas complicações de saúde, dores, tratamentos, infecções, coma, enxertos, superações, enfim lutando para sobreviver e ainda teve que lidar com a dor da perda das pessoas que ela mais amava.
Vânia não se rendeu às adversidades e resolveu fazer do luto uma luta constante. Em 2013 deu a primeira palestra contando sua história de sofrimento, mas também de transformações que vivera nos três anos anteriores. Depois da primeira palestra nunca mais parou e descobriu ser esta sua “missão”, como define, de mostrar para as outras pessoas que apesar de toda tragédia é possível dar a volta por cima. “Iniciei um ciclo de palestras motivacionais, dirigidas especialmente aos pais e parentes enlutados. Ao término das palestras ministradas, atendia inúmeros pais que procuravam um alento a uma dor tão pungente, que nada se comparava ao vazio em perder o seu filho/filha”, conta Vânia.
Com o êxito do livro Pérolas no Asfalto e a repercussão das palestras, Vânia viu que era hora de desenvolver algo mais, como um grupo de acolhimento. Foi então que, juntamente com outras quatro mães – Aline Salazar, Hortência Varão, Jussara Pias e Maristela Corrêa – que também perderam seus filhos em situações distintas, amadureceram juntas a ideia de criar um projeto que desse suporte aos pais que perdem seus filhos. O projeto ganhou forças e acabou se estendendo a qualquer pessoa que tem que superar a morte de alguém próximo.

Grupos

Reuniões do grupo de apoio.
Para mais informações as idealizadoras estão disponíveis nos telefones 98155-8537 Aline, 98306-8600 Hortência, 99993-8173 Vânia, 99973-1012 Jussara e 99215-449 Maristela.

Não existem grupos como este no Distrito Federal onde uma pessoa que está sofrendo o luto possa ser ouvida e dividir a sua dor. Vânia destaca a importância de ter um espaço específico para que as pessoas se abram para falar sobre o assunto e como as reuniões trazem resultados positivos após a interação com outras pessoas presentes. “Não é se alegrar com a perda do outro, mas através das narrativas é possível mensurar a sua dor com a do outro. Eu que perdi quatro filhos e uma pessoa que perdeu um filho tem a mesma dor, é o mesmo luto, é a mesma solidão. A cada vivência com o grupo, notamos uma sensível ressignificação, bem como indícios de retorno à vida de formas mais produtivas e funcionais”, diz a idealizadora do grupo de acolhimento.
Vânia ainda ressalta a importância de procurar ajuda nessa fase dolorosa e de não desistir da vida. “Através do grupo vimos que não nos sentíamos mais sozinhas. Não é fácil lidar com a perda de um ente querido, sem auxílio e perspectivas de melhoras. E nesse momento, o amparo mútuo é de extrema importância. Somos todos aprendizes, e estamos, de fato, dispostas a doar o que temos de mais latente em nosso processo de superação: coragem para nos unirmos e transmutar a dor em força”, completa.