Por Zuleika Lopes, do Metrópoles
Já se passaram um ano e cinco meses desde que a capoeirista Sandra Rodrigues, a Sandrinha, 37 anos, foi encontrada carbonizada em um contêiner de obras na avenida principal do Guará I, chocando toda uma comunidade que a viu crescer e desenvolver seu lado social nas praças da cidade. As suspeitas logo recaíram no companheiro Márcio do Nascimento Batista, 36 anos, conhecido como “Mano”, que foi preso logo em seguida ao crime. Apesar de todas as evidências, ele continua negando o crime e a data do júri popular vem sendo adiada por causa dos recursos impetrados pela defesa do acusado.
Disposta a lutar por justiça, a irmã da vítima, Sheiza Braga, retornou ao Distrito Federal com o objetivo de acompanhar de perto o desenrolar do inquérito. ”Minha família foi literalmente destruída. A perda brutal de um ente querido sempre deixa sequelas e um vazio irreparável. Nossa mãe se mudou para João Pessoa e levou os dois órfãos, Gabriela, 10 anos, e o adolescente Vinicius, hoje com 16 anos. Minha mãe não tem condições psicológicas de lutar por justiça. Saiu de Brasília por não suportar a dor de passar todos os dias na frente de onde minha irmã foi brutalmente assassinada, e eu ,como irmã mais velha, voltei para lutar por ela, por mim e por todas as mulheres”, afirma, emocionada.
Segundo ela, a Lei Maria da Penha, que completa 13 anos em 201,9 foi o primeiro passo para a Lei do Feminicídio. “Minha irmã foi morta por ser mulher e da maneira mais cruel possível. O feminicídio tem que acabar no nosso país. Quantas Marias ainda precisam morrer? Me sinto impotente como irmã e como mulher. Mas, tenho uma esperança enorme de que a justiça será feita. Que nossas leis façam valer a pena a dor das famílias destruídas. Hoje vivo em função de ver o assassino pagar pelo que fez”, relata a irmã da capoeirista.
Capoeirista
Sandra Rodrigues foi uma menina alegre de uma família cristã moradora do Guará I. Tinha cinco irmãs – três por parte de mãe e duas por parte de pai. Se apaixonou pela capoeira desde criança e, ao longo do tempo, passou os seus conhecimento adiante. Passou a ser a “Sandrinha da Capoeira”, que dava aulas nas praças públicas do Guará. Seu amor pelo esporte logo ganhou vários adeptos no meio da juventude da cidade. Todo o seu empenho por uma vida saudável foi por água baixo quando passou a ser dependente química, como muitos jovens dos anos 90. Sua família a abraçou e ela fez vários tratamentos para deixar o vício. Todos em vão. Ao ter como companheiro, o “Mano”, selou sua triste sorte, com a vida ceifada aos 37 anos de idade e, com muitos sonhos pela frente, principalmente, deixar o vício e criar seus filhos com dignidade, segundo relato da irmã.
Justiça
A advogada criminalista Julia Oliveira, que atua na área há 25 anos, explica os motivos da demora e da protelação para a marcação do julgamento. Os recursos inerentes a um processo judicial são protelatórios. “No caso do Márcio Nascimento Batista, a família da vítima procura uma resposta do Estado, ansiosa por justiça. Não entendem que existem procedimentos dentro do Código Penal, são inerente tanto da defesa quanto da acusação e do juízo. Temos casos, como do ex deputado Adão Xavier, de repercussão nacional, que o processo está em trâmite. O caso da Adriana Vilela, acusada de matar os pais na 113 Sul foi em 2004 e ainda não tem solução”, explica. “Mano, o acusado, está respondendo por homicídio e feminicídio. Já está com o processo bem adiantado, já houve instrução, está em fase de recurso de sentido estrito, quando a defesa do acusado pede para retirar exclusão do feminicídio, alegando que eles não tinham relacionamento amoroso. Já houve toda a instrução, as autoridades policiais trabalharam usando o recurso do tempo, o Ministério Público também, e já ouve uma sentença de pronuncia para que ele seja submetido ao tribunal do júri”, completa criminalista.
Segundo a advogada, cada recurso pode demorar vários anos para ser analisado e são possíveis vários recursos e embargos. No caso dos recursos criminais, previstos em lei, eles existem para possibilitar a ampla defesa do réu. E são cumpridos rigorosamente pela justiça. Se por um lado a defesa tenta excluir a tese de feminicídio, já que o acusado já tinha várias passagens pela polícia, e também dependente químico, a especialista em segurança pública e ex-titular da SSP- DF, Márcia de Alencar, o corpo carbonizado de Sandrinha já demonstra a crueldade e o planejamento do fato ocorrido no dia 4 de março. “Segundo a criminologia crítica, o perverso mostra seu prazer e sua fúria através da forma como pratica a sua maldade. Ele não age por impulso simplesmente. Ele planeja e age como um ritual. Para os religiosos, é considerado um ritual satânico”, pontua Márcia.
“Sabemos que nada trará de volta minha irmã, mas o mínimo que esperamos das autoridades competentes é que a justiça seja feita, porque ninguém tem o direito de tirar a vida de ninguém. O Márcio não acabou só com a vida da Sandra, e sim da minha família. Perdi uma irmã, meus sobrinhos ficaram órfãos. Nossas vidas foram transformadas, e, infelizmente, isso não tem conserto”, finaliza Sheiza.