Confinamento aumentou em 20% violência doméstica no DF

Órgãos e programas como o Pro-Vitima, o Provid, a Delegacia da Mulher e o Conselho Tutelar oferecem uma rede apoio às vítimas, mesmo assim muitas temem denunciar os agressores. Veja onde pedir ajuda no Guará

O confinamento familiar provocado pela pandemia da Covid-19 aumentou em cerca de 20% os casos de violência doméstica no Distrito Federal, de acordo com levantamento dos órgãos de apoio e de defesa das vítimas desses tipos de crimes, principalmente mulheres e crianças. Essa mudança de rotina dentro de casa que acaba gerando depressão, ansiedade, raiva e sobrecarga emocional, são as principais causas das agressões, em grande parte do marido ou pai contra a mulher e os filhos. Como a maioria dessa faixa mais frágil é dependente financeiramente do provedor da casa, boa parte dos casos de violência doméstica não é relatada à polícia ou à justiça, por medo de represália física ou pecuniária, mas também por desconhecimento de que a órgãos recorrer.
Diferente do que a maioria ainda pensa, a violência doméstica não é apenas um caso de polícia. Existem órgãos do governo que oferecem proteção e apoio a essas vítimas, cada um com funções diferentes ou até semelhantes, mas interagindo entre si através da Rede Social, formada por Centro de Referência Especializado de Assistência Social Creas), Centro Refe-rência e Assistência Social (Cras), Conselho Tutelar, Pró-Vítima, Provid, Polícias Civil e Militar, e ONGs. A Secretaria de Justiça e Cidadania, por exemplo, dispõe do programa Pro-Vítima, que oferece apoio emocional às vítimas de agressão psica, moral, patrimonial, sexual e física, através de assistentes sociais e psicólogos. A Polícia Militar faz o acompanhamento e oferece segurança através do Policiamento Ostensivo às Vítimas de Violência Doméstica, o Provid. Já as crianças vítimas de violência são assistidas pelo Conselho Tutelar da Criança e do Adolescente. No caso dos três órgãos, parte da demanda é encaminhada pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e das polícias Militar e Civil, mas há também demanda espontânea, em que os profissionais fazem o atendimento direto quando tem conhecimento ou flagram algum tipo de violência doméstica.
Para o morador da região do Guará, o Pro-Vítima atende na quadra Lúcio Costa, onde tem sua sede, o Provid no 4º Batalhão da Polícia Militar e o Conselho Tutelar na QE 26 (ver endereços abaixo).

Para a chefe do núcleo do Pró-Vítima no Guará, Suzete Trigueiro, a sobrecarga emocial provocado pelo confinamento é a principal causa das agressões
Aumento da procura na pandemia

O núcleo do Pro-Vítima da quadra Lúcio Costa atende de 10 a 15 casos por dia de vítimas de violência doméstica, contra uma média de 8 a 10 antes da pandemia. Mas o núcleo não atende apenas moradores do Guará e seu raio alcança as cidades em volta, incluindo a Região da Estrutural, onde está a favela Santa Luzia, considerada a mais carente do Distrito Federal – a extrema pobreza é o maior foco da violência doméstica. Além da agressão física, o núcleo ampara vítimas de violência sexual, de tráfico de pessoas, de homicídio e de acidentes de qualquer natureza que precise de suporte psicossocial, de segurança e até de apoio social para os casos de quem não tenha o que comer e onde morar. Esse serviço é executado pela equipe integrada por duas psicólogas e duas assistentes sociais, incluindo a chefe do Núcleo do Guará, Suzete Trigueiro da Rocha, e o técnico administrativo Carlos Barbosa.
Os crimes de feminicídio e as agressões vividas por muitas mulheres acabam vitimando várias outras pessoas. Familiares, amigos ou quem mais, por algum motivo, assiste aos atos de fúria e barbárie também precisa de tratamento. No Pró-Vítima, psicólogos e assistentes sociais oferecem atendimento especializado a essas vítimas. “São pessoas que, de alguma forma, vivenciaram a dor de outra pessoa. Temos avós, mães, tias e irmãs que agora se veem na situação de cuidar dos filhos das vítimas e não sabem como lidar com isso. Imagine crianças que ficaram sem pai e sem mãe”, explica a chefe do Núcleo do Pró-Vitima no Guará, Gizele Trigueiro da Rocha.
De acordo com Suzete, essa média de 15 a 20 atendimentos por dia são de casos confirmados de violência, porque a procura é bem maior. “Ao recebermos as denúncias, fazemos uma triagem e nem todos os casos se confirmam como necessidade de atendimento. Às vezes pode ser uma simples vingança contra a outra pessoa. Por isso, essa análise tem que ser feita com muita sensibilidade de nossa parte”, explica. Ela conta que no período da pandemia os atendimentos eram feitos através da Internet, mas agora, com o avanço da vacinação, passaram a ser presenciais, com todas as medidas sanitárias recomendadas.
O Pro-Vítima atendia apenas os casos encaminhados pelos órgãos parceiros e o atendimento acontecia após o fato, mas, segundo Gizele Cavalcante Xavier, uma das duas psicólogas do Núcleo, a Secretaria de Justiça e Cidadania está orientando o investimento também na prevenção, com palestras e visitas às escolas e a famílias com histórico de violência no lar. “Promovemos rodas de conversas com debates e reflexões sobre o combate da violência doméstica”, completa. Em salas reservadas, o Pró-Vítima acolhe as vítimas, em sua maioria mulheres, e as orienta sobre seus direitos socioassistenciais. O programa oferece sessões de terapia de apoio individual, com foco na violência vivenciada, para o restabelecimento do equilíbrio mental e emocional. Quando a triagem indica necessidade de atendimento psicológico, as vítimas participam de até 12 seções, para não sobrecarregar a demanda do Núcleo e impedir a continuação do atendimento a outras pessoas.

A psicóloga Gizele Cavalcante conta que o Pró-Vítima está investindo também na prevenção e não apenas no fato consumado
Dependência prejudica

Uma das preocupações do programa é com a dependência econômica da vítima em relação ao agressor, um dos fatores que inibem as denúncias. Para ajudar na redução dessa dependência, o Pro-Vítima criou o Banco de Talentos, que oferece oportunidade à vítima para revender produtos artesanais ou comida que confecciona, cosméticos e produtos e utensílios como Tapeware, em feiras montadas em eventos de grande movimento promovidos pelo governo a cada 15 dias.
“Acreditamos que, com a volta ao normal pós pandemia, essa média vá caindo aos poucos, com a redução do confinamento e a ampliação das informações sobre os atendimentos que o governo oferece às vítimas da violência doméstica”, prevê Suzete Trigueiro.

Provid, a segurança oferecida pela Polícia Militar

Mais voltado à segurança física, o Policiamento Ostensivo de Combate à Violência Doméstica (Provid) foi criado pela Polícia Militar do DF para proteger as crianças, as mulheres e os idosos, ou qualquer pessoa em situação de vulnerabilidade, contra as agressões dentro de casa. O programa atende principalmente os casos encaminhados pelo Tribunal de Justiça do DF e Territórios (TJDFT), mas, assim como o Pró-Vítima, também atende casos pontuais, como por exemplo uma mulher que esteja sofrendo violência do marido no momento da denúncia.
A diferença do Provid para o Pro-Vítima é que o primeiro tem o poder de polícia, ou seja, de prender o agressor se caso necessário. Coordenador do núcleo do Provid no 4º Batalhão da Polícia Militar do Guará, o sargento Marcos Zanina explica que a intenção do programa não é apenas prender o agressor, mas também evitar a agressão. “Mesmo se as ameaças não foram ainda consumadas, procuramos evitar que sejam através de visitas periódicas às famílias objeto das denúncias, até que tenhamos a segurança que a situação esteja minimamente pacificada”.

Coordenador do Provid no Guará, sargento Zanina, e o comandante do 4º Batalhão, cel Aragão, dedicam atenção especial ao programa de apoio às vítimas de violência doméstica

Para o comandante do 4º Batalhão da PM, coronel Everaldo Aragão, a tendência é que a violência doméstica vá reduzindo à medida em que campanhas de conscientização promovidos pelos órgãos da Justiça, da Polícia e de atendimento social sejam disseminadas na sociedade. “Se considerarmos médias anteriores de homicídios no Distrito Federal, percebemos que elas tem reduzido, porque o agressor tem percebido o cerco que o governo tem promovido através de seus órgãos de apoio às vítimas”, avalia.

Conselho Tutelar protege as crianças e adolescentes

Para o conselheiro tutelar Afonso Alves, o mais antigo do Conselho do Guará, a criança é a principal vítima da impaciência dos adultos

As consequências do confinamento, da perda do emprego, do afastamento social foram causas do aumento da violência doméstica, principalmente às crianças e adolescentes, por serem mais frágeis e mais vulneráveis à impaciência dos adultos. Além dos mais de 1 mil casos acompanhados pelo Conselho – o atendimento não se resume à denúncia pontual, mas também ao aconselhamento familiar e verificação do cumprimento das medidas protetivas – o Conselho Tutelar do Guará está recebendo em média de seis a dez denúncias (com picos de até 15) de violência contra jovens por dia. O lado menos ruim é que parte dessas denúncias não se confirma, porque são feitas por vizinhos preocupados com gritos e discussões mais acirradas entre pais e filhos ou entre irmãos de idades distantes. “Quando vamos conferir, constatamos que boa parte das denúncias não configura agressão física e não passa de momentos de impaciência na família”, explica o conselheiro Afonso Alves, que está na sua terceira gestão no Conselho Tutelar do Guará. “O problema maior é que parte das agressões comprovadas ou da exaltação dos adultos é contra crianças com síndromes de TDH (dificuldade de atenção, hiperatividade e impulsividade) e autismo (dificuldade de comunicação, dificuldade com interações sociais, interesses obsessivos e comportamentos repetitivos)”, acrescenta.
Outra demanda recorrente nesse período de pandemia é a situação de conflito entre pais separados com guarda compartilhada dos filhos. “Por causa da preocupação com idosos em casa, muitos pais e mães evitam pegar os filhos na data estipulada pela Justiça, sobrecarregando o outro, o que gera o conflito. Aí eles recorrem ao Conselho mesmo tendo uma medida judicial definida”, conta a conselheira Maria Madalena Oliveira. Nesses casos, a recomendação é a parte prejudicada procurar a Defensoria Pública e não o Conselho Tutelar.

 

GDF cria canais para recebimento de denúncias

Entidade da Organização das Nações Unidas (ONU) para a Igualdade de Gênero e o Empoderamento das Mulheres, a ONU Mulheres publicou em junho passado, documento alertando que as mulheres podem sofrer impactos de violência doméstica por estarem, muitas vezes, em domicílio, sem poder sair e isoladas ao lado de seus agressores.
Em vários países foi identificado que essas mulheres que tiveram restrição de locomoção e acesso a equipamentos públicos encontraram dificuldade em buscar ajuda e serem acolhidas pelos serviços disponibilizados pelos governos.

“Profissionais da assistência e da segurança pública estão sempre disponíveis para o atendimento aos casos de violência doméstica”, explica o secretário . Eles seguem as recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS) e do Ministério da Saúde e também adequamos nossos serviços. Os Centros de Atendimento à Mulher estão abertos. A ideia é que as mulheres tenham um local em caso de emergência para serem atendidas. Também estamos disponibilizando nove canais de telefone, por região, por cidade, para que a vítima entre em contato e seja atendida por especialista”, explica o secretário de Segurança Pública, Júlio Danilo Ferreira.
Os canais de atendimento disponibilizados pela Secretaria de Segurança Pública seguem funcionando 24h durante a pandemia. Denúncias e registros podem ser feitos pelo Denúncia Online, pelo telefone 197 (opção 0), pelo e-mail denuncia197@pcdf.df.gov.br, pelo whatsapp no número (61) 98626-1197, pelo telefone 190 e nas delegacias especializadas.
Os Centros Especializados de Atendimento à Mulher (Ceam) também estão funcionando entre 10h e 16h30, de segunda a sexta-feira, na estação do Metrô da 102 Sul, no Plano Piloto, em Ceilândia (QNM 2, Conjunto J, Lote 1/3) e em Planaltina (Jardim Roriz, área especial, entrequadras 1 e 2). A Secretaria da Mulher ainda disponibiliza os serviços da Casa Abrigo e dos Núcleos de Atendimento às Famílias e aos Autores de Violência Doméstica (Nafavd) como formas de acolhimento para vítimas de violência. Veja aqui os números e demais informações sobre esses serviços.

Radiografia dos casos no DF

Estudo da Secretaria de Segurança Pública (SSP-DF) divulgado no final do ano passado, quando a Lei Maria da Penha completou 14 anos, revela que a quase totalidade das ocorrências de violência contra a mulher (96,9% dos casos) teve origem em residências. O estudo mostra ainda que a idade do agressor varia entre 18 e 40 anos em 65,5% das ocorrências. Em 19,1% delas, os agressores tinham idade entre 41 e 50 anos, enquanto em 7,5% dos casos, entre 51 e 60 anos. A quantidade de agressores com mais de 60 anos foi de 3,1%, enquanto pessoas com menos 18 anos equivalem a 1,3%. A maioria dos agressores, 90,3%, era do sexo masculino. Em 9,7% do total eram agressoras, ou seja, do sexo feminino.
Já as vítimas tinham entre 18 e 30 anos em 36,9% dos casos; 31 a 40 em 27,3%; 41 a 50 anos em 17,4%; e 51 a 60 anos em 6,5% das ocorrências. Pessoas com mais de 60 anos estão em 4,9% das ocorrências e, com menos de 18 anos, em 6,2% dos casos.

Lista de agressões

A violência moral e psicológica – diz respeito a injúria, difamação, ameaça e perturbação da tranquilidade – foi a maior incidência (82,3%) entre as demais violências especificadas pela Lei Maria da Penha, que são a sexual, a patrimonial e a física. Em algumas ocorrências há mais de um tipo de violência. Do total de registros, a violência patrimonial está evidente em 43,5% das ocorrências, a física em 46,4% e a sexual em 2,8% dos casos.
A totalidade de registros se confirma com os atendimentos realizados pelo Provid, da Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF). O projeto tem o objetivo de prevenir, inibir e interromper o ciclo da violência doméstica.
A maior parte dos 4.272 atendimentos refere-se a ameaças, como afirma a coordenadora do Provid, tenente Adriana Vilela. “Grande parte das denúncias que recebemos trata-se de ameaças. Desta forma, o policial que faz o atendimento procura entender o caso e depois faz as devidas orientações à vítima, como registrar ocorrência. Mas, antes de qualquer decisão, fazemos um trabalho para dar segurança a essa vítima, para que ela se sinta amparada e segura para tomar as decisões cabíveis”, esclarece a policial.

 

Lei Maria da Penha reduz violência doméstica

A Lei Maria da Penha disponibiliza as Medidas Protetivas de Urgência (MPU), considerada uma das principais conquistas para as vítimas de violência pela coordenadora do Núcleo Judiciário da Mulher, juíza Luciana Lopes Rocha, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Território (TJDFT). “A medida protetiva é o coração da lei. É ela que evita a escalada da violência, que muitas vezes é cíclica. Exemplo disso são as vítimas de feminicídio, em que quase a totalidade nunca havia sequer registrado uma ocorrência de violência doméstica”, garante a titular do Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher.
“O fortalecimento das medidas protetivas ocorre por meio de três pilares que permeiam as parcerias entre o Judiciário e a Segurança Pública: o monitoramento possível eletrônico, que é primordial, os atendimentos psicossociais de vítimas e autores e a capacitação dos servidores da segurança”, explica a juíza.

Denúncias salvam vidas

A coordenadora do Núcleo de Assistência Jurídica de Defesa da Mulher, Dulcielly Nóbrega de Almeida, reforça a importância de buscar apoio, seja no Pró-Vítima, nas delegacias ou nas unidades do Centro de Atendimento Especializado à Mulher (Ceam). A defensora lembra que as orientações disponíveis podem ajudar a mulher a se encorajar para o registro da denúncia e, assim, evitar uma tragédia. “A gente vê pelas estatísticas que a denúncia e as medidas protetivas salvam vidas”, avalia. “Apenas em 1,5% dos casos das mulheres vítimas de feminicídio, havia algum tipo de medida protetiva em vigência. Isso significa que, para muitos homens, a denúncia ou mesmo a medida protetiva fez a diferença, seja porque eles têm medo de perder o emprego ou de serem presos”.
De acordo com Dulcielly, o agressor da violência doméstica não tem um perfil definido. “Geralmente, é um trabalhador, pai de família, um homem comum. Ele tem medo da Justiça e vai respeitar a ordem judicial. Veja que 72% das mulheres que morreram não tinham nem sequer denunciado o agressor. ” Os dados são de pesquisa realizada em março pela Secretaria de Segurança Pública (SSP-DF).

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