No domingo passado, 28 de agosto, a avenida central do Guará II, no trecho entre a 4ª Delegacia de Polícia e o Edifício Consei, foi novamente fechado para os veículos. Essa tradição, nascida em 2015 com a Rota 156, ainda que o fechamento tenha acontecido pontualmente no passado, é lei. Na verdade, duas leis. Uma oriunda da Câmara Legislativa, inspirada no evento guaraense, e um decreto publicado no mês passado, regulamentando a prática em todas as cidades do DF.
Pensando em retomar o evento, no último domingo do mês, o novo administrador regional do Guará, Roberto Nobre, solicitou ao Detran e outros órgãos o fechamento da rua. Mas só anunciou a decisão na sexta-feira anterior ao fechamento. Sem atrativos, a rua foi ocupada apenas pelos moradores próximos, apenas com crianças e animais, e cabos eleitorais propagando seus candidatos.
Sem publicidade, sem convite, principalmente sem atrações, poucos moradores desceram de seus apartamentos para praticar esporte e passear. O fato é que a rua vazia, apenas fechada aos carros, é um acontecimento muito diferente do que os moradores estavam acostumados.
Os produtores culturais da cidade e os líderes comunitários das redondezas reclamaram que não foram ouvidos e, ainda se fossem convidados, não teriam tempo para produzir alguma coisa. O administrador regional Roberto Nobre justifica que recebeu a confirmação do Detran apenas na sexta e não pôde mobilizar a comunidade.
E o futuro?
Será que a Rua do Lazer voltará a ter a variedade de atividades que oferecia, como na época da Rota 156, ou mesmo posteriormente, quando grupos independentes e empresários do local ofereciam as atrações? Como viabilizar um grande evento como este?
O administrador regional garante que o trecho voltará a ser fechado todo último domingo de cada mês, e que vai convidar a comunidade para conversar na próxima semana. “Entrei agora e estamos ainda tomando pé da situação, nos ambientando ao Guará, apesar de sempre ter morado e trabalhado aqui. Estou focado em ouvir a população e buscar soluções”, explica.
Mas, como viabilizar as atividades?. No surgimento da Rota 156 o evento era realizado com recursos do próprio grupo organizar e dos comerciantes da avenida, principalmente os restaurantes que viam seus salões lotarem no domingo. Outra estratégia era utilizar atrações prestadas por órgãos públicos e entidades do Sistema S, como as viaturas e cães da polícia militar, os caminhões dos bombeiros, os serviços do Sesc, o caminhão da polícia civil, agências móveis da antiga CEB, distribuição de água da Caesb e outros atrativos. Esses serviços podem facilmente voltar ao evento, mas precisam ser solicitados pela própria Administração do Guará, que passa a assumir a organização.
Outra possibilidade é que a Administração Regional utilize seus próprios recursos voltados para eventos culturais para levar atrações à via. Há no orçamento deste ano do órgão R$ 200 mil para eventos culturais e nada foi utilizado até agora e, se o que aconteceu nos últimos 4 anos se repetir, nada será utilizado. Uma forma de atrair os grupos culturais e esportivos seria oferecer uma estrutura mínima para que eles possam estar presentes, como tendas, banheiros químicos, energia elétrica e som. Assim, produtores independentes poderiam captar recursos para garantir o restante, como é o caso dos cachês. Ao menos teriam a estrutura mínima garantida. Faltando apenas 4 meses de 2002, o recurso disponível seria mais que suficiente.
Ainda há a possibilidade de cotizar quem quer trabalhar na via, como expositores, artesãos e foodtrucks, mas se a Administração não pode exercer o papel arrecadador de recursos desta forma, dependeria de que uma entidade privada fizesse a produção, com o aval da Administração do Guará.
O fato é que a Rua do Lazer voltou e será realizada no último domingo de cada mês no local tradicional. Na próxima semana uma reunião na Administração Regional com todos os produtores interessados vai discutir os próximos passos e soluções.
História e legislação
A Rota 156, criada em 2015, foi um marco não apenas para o Guará, mas para todo o Distrito Federal; A iniciativa que propunha o fechamento da avenida central do Guará II uma vez ao mês foi a inspiração para a criação da lei distrital Nº 5.630/2016, que determina a eventual interrupção do tráfego de veículos em trechos de vias públicas de cada região administrativa do Distrito Federal para realização de atividades de lazer e recreação (lei de autoria dos então deputados distritais Professor Israel e Júlio Cézar). Faltava o governo regulamentar essa lei através de decreto.
Mas, ao invés disso, o governo optou por editar um texto totalmente novo, o Decreto nº 43.485, que institui o programa Rua do Lazer em todas as regiões administrativas do DF. Na hierarquia dos atos normativos, a lei se sobrepõe ao decreto, que existe para regulamentá-la.
Apesar do conflito de entendimentos legais, na prática o que acontece é que a rua de lazer finalmente virou programa de governo. As administrações regionais precisam determinar onde e quando serão realizadas, como por exemplo no Guará que já é consagrado pela tradição que aconteça sempre no último domingo do mês no trecho da avenida central entre a 4ª Delegacia de Polícia e o Edifício Consei. A própria Administração Regional é a responsável por arregimentar todos os órgãos públicos que precisam estar presentes, como a Polícia Militar, o DF Legal, o SLU, o Detran e outros, mas a coordenação é da Secretaria de Esporte e Lazer. O processo de solicitação de implantação passará por análise do corpo técnico de órgãos como DF Legal, Secretaria de Transporte e Mobilidade (Semob), Secretaria de Segurança Pública (SSP) e Departamento de Estradas de Rodagem (DER), que vão ajudar a definir os melhores pontos para o programa em cada região.
O horário de fechamento das vias no decreto é um pouco diferente da lei anterior (agora deve-se reabrir a via às 17h e não às 18h), mas o próprio texto deixa espaço para flexibilizar este horário. A Rua do Lazer inclui fechamento de pontos específicos aos domingos e feriados, desde que a operação seja requerida com antecedência mínima de 30 dias. O trânsito de veículos no local será proibido durante o horário de funcionamento do programa, e o uso de sinalização viária para bloqueio da via é obrigatório.