O episódio da ocupação e desocupação da antiga sede da Casa da Cultura, no Cave, teve mais um capítulo no final da semana passada e promete outros para os próximos dias. Depois que o grupo de mulheres do Movimento Olga Benário foi retirado à força pela Polícia Militar na quarta-feira passada, 23 de novembro, a pedido da Administração Regional do Guará, a Justiça concedeu uma medida cautelar permitindo o retorno do grupo ao prédio um dia depois. Mas a situação continua tensa, porque a Administração recorreu contra a liminar e o grupo continua na expectativa de outra ação de desocupação, caso a Justiça aceite os argumentos do governo.
Na decisão que permitiu a reocupação, o juiz Carlos Frederico Maroja de Medeiros, da Vara de Meio Ambiente, Desenvolvimento Urbano e Fundiário do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, acatou os argumentos do movimento e determinou “a suspensão de quaisquer atos de remoção do projeto social e das pessoas abrigadas no imóvel mencionado na inicial, ao menos até a coleta de melhores elementos de convicção tendentes à decisão segura quanto ao pedido de antecipação de tutela”.
Com o documento em mãos, as mulheres do movimento Olga Benário voltaram ao imóvel, mas reclamam que tiveram parte dos seus pertences, recolhidos durante a desocupação, danificados ou extraviados. “A geladeira voltou sem funcionar, não nos devolveram um aparelho celular e o caderno de visitantes”, afirma Maria Eduarda Carvalho, uma das líderes do movimento. Aliás, para conseguir de volta a devolução do que foi recolhido ao Pátio de Obras da Administração do Guará o grupo teve que conseguir uma outra liminar na Justiça. Elas reclamam também do cerco à distância que vem recebendo, com a circulação de veículos da Polícia Militar ou da Administração Regional nas proximidades da casa.
Mesmo com a pressão, o grupo mantém a esperança de conseguir a permissão para continuar na casa, principalmente por causa de dois laudos técnicos, elaborados por uma engenheira civil, garantido que as instalações não correm risco de ruir, ao contrário do que garante a Administração Regional, e outro da Novacap. Os dois lados dão interpretações diferentes ao laudo da Novacap, elaborado pela Defesa Civil, que aponta riscos de desabamento e recomenda providências para a recuperação. Para a Administração Regional, não há solução, principalmente porque o laudo recomenda também a demolição do prédio. Já o movimento interpreta que basta promover a recuperação recomendada que o prédio tem condições de ser ocupado. “Já estamos inclusive buscando recursos para a recuperação, através de campanhas de arrecadação de material de construção”, informa Maria Eduarda.
Tumultuada desocupação
A desocupação da semana passada foi bastante tensa. A operação da Polícia Militar com cerca de 20 policiais foi recebida por um grupo aproximado de 50 pessoas, entre mulheres do movimento e simpatizantes, com xingamentos e tentativa de resistência, o que acabou em agressões físicas e até uma prisão. Mas a casa foi desocupada, mesmo que à força.
A pedido da Administração Regional do Guará, a Polícia Militar tentou inicialmente convencer o grupo, formado por 15 mulheres, a desocupar o prédio pacificamente, mas não foi atendida. A tentativa de desocupação ampliou a solidariedade de parte dos moradores ao movimento, principalmente ligados ao segmento cultural, que criticava o fato do órgão solicitar a retirada de um prédio que estava fechado há cerca de nove anos e estava praticamente abandonado, em vez de permitir o seu uso para o desenvolvimento de um projeto que se propõe a atender mulheres vítimas de violência. A Administração Regional, por seu lado, alegava que havia risco de segurança aos ocupantes, uma vez que um laudo da Defesa Civil condenava as instalações.
Numa reunião na Administração Regional, o administrador regional, Roberto Nobre, reafirmou aos representantes do Movimento Olga Benário, do Conselho de Cultura do Guará e à deputada federal Erika Kokay (PT), que acompanhou o grupo, a determinação de desocupar o prédio, mesmo diante dos pedidos de tolerância à ocupação. Sem qualquer sinalização do administrador regional de que seria atendido, o grupo de mulheres, com apoio de um grupo de advogados simpático ao movimento, ingressou na Justiça com o instrumento de “Obrigação de Não Fazer”, que impediria qualquer ação de desocupação à força. Mas, antes que a Justiça se pronunciasse, a Polícia Militar retornou para retirar os ocupantes e tudo que estava dentro da casa.
A operação policial começou antes das 10h quando haviam poucas pessoas dentro da casa e terminou após as 13h, por causa da resistência do grupo e dos seus simpatizantes. Na tentativa de evitar a retirada dos móveis e objetos, algumas das mulheres se posicionaram na entrada do prédio para impedir a entrada dos militares, e aí a operação ficou mais tensa, inclusive com a prisão de uma das ocupantes por desacato e resistência. Ela foi encaminhada à 1ª Delegacia de Polícia (Asa Sul), responsável por prisões em flagrante, e depois de assinar um Termo Circunstanciado foi solta e vai responder ao processo em liberdade.