Por Vinícius Neves
Há cinco meses os moradores do conjunto F da QE 15 do Guará II receberam no conjunto estritamente residencial um vizinho “altamente antenado”, inusitado e, principalmente, indesejável: uma torre de transmissão de 18 metros de altura instalada em uma propriedade que antes era apenas mais uma casa residencial, alugada para um morador. Após a saída do inquilino, o espaço recebeu a indiscreta torre de transmissão, da operadora Vivo, de telefonia.
Os moradores temem prejuízos à saúde por estarem tão perto dos sinais da torre. “Sou leigo, mas sei que essas torres provocam radiação. Se adoecermos, quem será o responsável?”, pergunta o morador.
O local da estação, sem qualquer identificação nas portas sobre a finalidade da torre ou empresa responsável, fica ao lado de duas residências, como é o caso de Antônio. “Isso que estamos passando é uma humilhação. A gente passa 50 anos trabalhando para comprar uma casa e sofre essa humilhação”, lamenta.
Mas a preocupação dos moradores em relação aos riscos de radiação não se justifica. De acordo com pesquisa na Internet não existem estudos conclusivos acerca de possíveis malefícios, como câncer, por exemplo.
Anatel diz que estação não é prejudicial à saúde
Procurada pela reportagem do Jornal do Guará, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) informou que a estação – termo para o conjunto de equipamentos e meios necessários à realização de telecomunicação e as instalações que os abrigam – montada ao lado das residências não ultrapassou “os limites à exposição humana a campos elétricos, magnéticos e eletromagnéticos”. Os limites estão estabelecidos no Mapa de Medições de Campos Eletromagnéticos, disponível no site da agência reguladora. Ainda em nota, a Anatel informa que tal “estação” foi licenciada em 20 de setembro de 2022 e utiliza as faixas de 2,5 GHz e 700 MHz – e também tecnologia 4G. Além disso, ela não utiliza frequências do 5G (stand alone, 5G puro) na faixa do 3,5 GHz, mas outras frequências utilizadas para a prestação de telefonia móvel – internet para smartphones.
A Anatel ainda observa que a comunidade científica investiga há anos os efeitos da exposição humana aos campos eletromagnéticos, tendo sido observado que o principal efeito é o aquecimento dos tecidos, algo que não é grave. “De acordo com estudos desenvolvidos no âmbito da Organização Mundial da Saúde (OMS), considerando os níveis muito baixos de exposição e os resultados das pesquisas reunidos até o momento, não existe evidência científica convincente de que os fracos sinais de radiofrequências provenientes de estações radiobase e de redes sem fio, causem efeitos adversos à saúde”, diz trecho da nota, que foi formulada com base em informações da Ficha Técnica nº 304 – Campos Eletromagnéticos e Saúde – Estações Radiobase e Tecnologias sem Fio, elaborada pela OMS.
“É natural do ser humano ter essa preocupação com a questão da radiação, mas é um assunto que já está pacificado, a partir de estudos da OMS”, afirma um diretor do antigo Sindicato Nacional das Empresas de Telefonia e de Serviço Móvel Celular (Sinditelebrasil), substituído pelo atual Sindicato Nacional das Empresas de Telefonia e de Serviço Móvel, Celular e Pessoal, ou apenas Conexis Brasil Digital – que é conduzida pelo José Guaraldi Félix, presidente da Claro Brasil. Os nomes mudaram, os executivos trocaram, mas permaneceram as opiniões favoráveis de que as estações são cientificamente seguras, não causando qualquer prejuízo à saúde dos moradores próximos.
A legislação que restringe a instalação das antenas sempre foi controversa e há trâmites dela nas mãos do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), decisões do Tribunal de Justiça do DF e Territórios (TJDFT) e alguns casos que chegaram até ao Supremo Tribunal Federal (STF), a última instância.
A Anatel confirmou que a estação da Vivo instalada na QE 15, não apresenta nenhuma irregularidade.
DF Legal acionado
Antônio diz que a situação junto aos órgãos de governo é um “empurra-empurra” de responsabilidades. “Todo mundo tirando da reta”, relatou. Um abaixo assinado foi organizado por Antônio Gilberto e cerca de 200 assinaturas de moradores foram recolhidas. O documento foi entregue aos cuidados da Secretaria de Estado de Proteção da Ordem Urbanística do Distrito Federal, o DF Legal, por meio do sistema de ouvidoria da capital federal.
No entanto, os assinantes declaram no documento que a torre está em desconformidade com a Lei Distrital 3.446/2004, uma lei que foi totalmente revogada por outra norma posterior, a lei Nº 5.726, de 17 de outubro de 2016. Citam também estar amparados pela Resolução 303/2002 da Anatel, também sem validade legal e substituída por outra resolução, Nº 700, de 28 de setembro de 2018.
Já a Lei nº 11.934, de 5 de maio de 2009, estabelece limites à exposição humana a campos elétricos, magnéticos e eletromagnéticos, associados ao funcionamento de estações transmissoras de radiocomunicação, de terminais de usuário e de sistemas de energia elétrica nas faixas de frequências até 300 GHz (trezentos gigahertz), visando a garantir a proteção da saúde e do meio ambiente. No Brasil são adotados os limites recomendados pela OMS, que por sua vez, adota os limites da Comissão Internacional de Proteção Contra Radiação Não Ionizante – ICNIRP.
“De forma geral, dada suas características técnicas típicas, pode-se afirmar que as ERBs do Serviço Móvel Pessoal atendem aos limites de exposição humana a campos eletromagnéticos (CEMRF) permitido no Brasil com uma grande margem (valores típicos de exposição estão abaixo de 2% do limite)”, diz a nota da agência reguladora.
A torre de transmissão não produz ruídos, zumbidos ou sons da estática, mas certamente causou bastante barulho na pacata vizinhança. Agora silenciosa, a poluição sonora aconteceu quando a torre foi instalada, por causa do uso de retroescavadeiras e grande circulação de caminhões e maquinário pesado de obras na estreita rua domiciliar. Na época do início da construção, em setembro, o Blog da Zuleika noticiou a indignação dos moradores com a gigantesca antena. O aposentado reclamava na época que as obras estavam acontecendo até mesmo durante o feriado de 7 de setembro, comemoração do Dia da Independência do Brasil. Nas fotos que acompanham a postagem da blogueira, é possível ver que a obra continuava sem estar identificada com placas ou qualquer informação sobre a empresa que assumiu o espaço – ou demais detalhes da obra, como a equipe de engenharia responsável pela instalação.
Caso não é novidade no Guará
A controvérsia envolvendo a instalação de estações de transmissão de rede móvel perto de escolas e residências é acompanhada há tempos pelo Jornal do Guará. Em agosto de 2016, JG publicou uma reportagem sobre a situação de antenas instaladas bem perto do Centro Educacional 03 do Guará, o “Centrão”. As matérias estão no acervo de edições, disponíveis no site jornaldoguara.com.br. À época, deputados e a então Agefis (hoje DF Legal) pediam a remoção das instalações por questões de saúde, que poderiam gerar um “apagão” na região – falta de fornecimento de Internet móvel para o celular dos cidadãos e clientes de operadoras de telefonia. No entanto, é bom ressaltar que a legislação sobre o tema sofreu uma série de mudanças – revogações – de 2016 até os dias de 2023.
Se tem alguém que ficou feliz com a chegada da torre, foi o casal de gaviões que, segundo o morador Antônio, fizeram ninho no topo da grande torre e se estabeleceram como os mais novos moradores da vizinhança. Do topo da torre a vista deve ser bonita.