Para quem sofre com o vício sabe que não é fácil deixar de fumar. Não basta apenas decidir parar. A dependência ao cigarro, como qualquer outra, exige muita força de vontade e às vezes um tratamento correto. Quatro Unidades Básicas de Saúde (UBSs) do Guará – QI 6, QE 23, QE 38 e Lúcio Costa oferecem tratamento a quem busca uma vida longe do cigarro. O Programa de Controle do Tabagismo é gratuito e é oferecido pela rede pública de saúde.
A lista de doenças associadas ao tabagismo é grande e vai além daquelas divulgadas nas próprias embalagens dos produtos. O câncer (principalmente de boca e pulmão) é a principal, mas pode acontecer também cegueira, envelhecimento precoce, impotência sexual, infarto, trombose, gangrena, parto prematuro (aborto) e morte. No dia 31 de maio se comemora o Dia Mundial Sem Tabaco, data criada em 1987 pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para alertar sobre os riscos do tabagismo.
Segundo levantamento do Ministério da Saúde, entre as capitais brasileiras, o Distrito Federal é a segunda com maior proporção de tabagistas no país, ficando atrás apenas de Campo Grande (MS) . Na capital federal, 11,8% da população acima dos 18 anos se declara fumante, de acordo com dados do Ministério da Saúde.
A farmacêutica Cristina Witt Crestani, que coordena os grupos junto com outros profissionais da saúde na UBS 1 do Guará, explica que além de medicações, há um acompanhamento psicoterápico com esses participantes: “É uma terapia cognitivo comportamental, uma abordagem em grupo com o paciente, juntamente com os medicamentos disponibilizados pelo Sistema Único de Saúde (SUS)”. Os medicamentos incluem adesivos de nicotina, chicletes de nicotina (ambos usados para diminuir os sintomas da crise de abstinência da substância) e bupropiona, uma medicação que é usada também no tratamento de transtornos mentais como ansiedade e depressão. “Além do paciente buscar a unidade quando quer parar, há também as abordagens do paciente no próprio acolhimento e nos consultórios médicos. Se o paciente tiver interesse, ele é encaminhado para fazer os grupos com a gente”, explica a coordenadora.
Não há medicações 100% eficazes contra o tabagismo. Ansiolíticos, antidepressivos e adesivos são considerados auxiliares, mas o processo exige uma abordagem multidisciplinar. “O tratamento do tabagismo feito na SES é voltado, principalmente, para o cognitivo comportamental. É uma questão de hábitos. Não adianta tratar somente a parte química, pois se a pessoa continuar com aquele hábito, ela vai retornar à dependência, ao vício”, acrescenta o assistente social Saulo de Oliveira, da Gerência de Vigilância Epidemiológica de Doenças e Agravos Não Transmissíveis e Promoção da Saúde da SES.
Tratamento cuidadoso
A taxa de pacientes que realmente conseguem parar de fumar é de 30%. Geralmente são três tentativas frustradas antes do sucesso. O primeiro passo é o Teste de Fagerström, que avalia a dependência de nicotina de cada pessoa. Depois, são iniciados os trabalhos em grupo e o acompanhamento com profissionais da SES, entre médicos, psicólogos, enfermeiros e até assistentes sociais.
Somente em 2022, foram 1.467 pessoas tratadas na rede pública, sendo 636 homens e 831 mulheres. Apesar delas serem a maioria no tratamento, há cerca de três homens com o vício no Distrito Federal para cada mulher tabagista. Em números gerais, a Subsecretaria de Vigilância à Saúde estima em 11,8% da população com o hábito, classificado como uma doença.
Grupos fechado e aberto
Há dois tipos de grupos: aberto e fechado. “O grupo aberto acontece toda semana, mas no grupo fechado, a gente espera ter um número de participantes para iniciar. Já no grupo aberto, a qualquer momento a pessoa pode entrar. Nosso objetivo é que seja sempre grupo aberto”, completa Cristina. Na UBS 1 do Guará, os grupos ocorrem toda segunda-feira, às 8h da manhã. Já na UBS 3, o grupo aberto acontece às quartas-feiras, pela manhã.
“Todos os pacientes que chegam à unidade para participar do grupo, é feito uma avaliação clínica com cada um, um teste para averiguar o grau de dependência do paciente – número de cigarros fumados por dia, se é dependência mais física, mental ou química – e, a partir disso, fazemos um plano de tratamento para aquele indivíduo”, explica a farmacêutica. “De acordo com a quantidade de cigarros que ele fuma, a gente sabe qual a concentração do adesivo que vai ser usado naquele paciente e se ele vai precisar de medicação para ansiedade”. Ela reforça que, apesar de ser um grupo, há um tratamento individual ao paciente e ressalta a dificuldade do tratamento. Cristina acrescenta que, em um grupo recente composto por 15 a 20 pessoas, sete participantes conseguiram parar de fumar de forma definitiva.
O analista jurídico Paulo Roberto de Faria Junior é um dos participantes que conseguiu parar de fumar frequentando os grupos da UBS 1 do Guará. Ele foi fumante por 29 anos e conseguiu se livrar do vício graças à ajuda que recebeu ao frequentar o grupo na UBS 1: “Eu já vinha tentando há algum tempo e não conseguia. Minha irmã já tinha me falado que o posto de saúde oferecia esse serviço para pessoas que queriam parar de fumar, então deixei meu nome e me chamaram”. Ele fumava cerca de 16 a 20 cigarros por dia e sentia os prejuízos à saúde: “Muita falta de ar e até dificuldade para falar”. Ele conta que fumou por 29 anos e recomenda o programa nas UBSs: “Sem as medicações, adesivos e a goma de mascar, acho que não conseguiria. Mas tem que partir da pessoa e ter muita força de vontade, pois é muito difícil”, reforça o agora ex-fumante.
Aguardar na fila
O interessado em participar pode procurar as UBSs do Guará e se informar no local. O Programa de Controle de Tabagismo no DF segue orientações, diretrizes e protocolos do Instituto Nacional do Câncer (Inca). No entanto, o início do tratamento pode não ser imediato para todos, já que algumas unidades de saúde dependem de um sistema de filas de espera para conseguir organizar a agenda dos grupos e, assim, atender todos aqueles que procuram ajuda. Já o fornecimento de medicações nas unidades depende de repasses destinados pelo Ministério da Saúde.