A estranha ocupação da Praça da Arte

Inaugurada em 1995, a Praça da Feira da Arte e Cultura, no centro do Guará I, foi ocupada esta semana pela construção de um quiosque, supostamente autorizada pelo ex-administrador Roberto Nobre

Na segunda-feira, 5 de junho, os comerciantes da QE 20, testemunharam a montagem de um cercamento na Praça das Artes, bem em frente à avenida central do Guará I. No primeiro momento não estranharam, achando que era a montagem de uma festa junina, ou outro evento, o que acontece frequentemente na praça. O local foi inaugurado em agosto de 1995 pelo então administrador do Guará Alírio Neto, com o nome de Praça da Feira de Arte e Cultura. Um equipamento cultural do Guará que tem sido palco de vários eventos nas últimas décadas.
Mas, os comerciantes ficaram surpresos quando começou a chegar material de construção e o piso da praça foi furado para receber fundações de uma obra. Conversando com os operários, foram informados que ali seria construído um quiosque, bem no meio da praça.

 

“Acabar com a Praça das Artes, doando este espaço a um quiosque é um absurdo. Nos meus 23 anos aqui no comércio, é a agressão mais grave ao espaço que já fizeram”, reclama o comerciante Elmo Gomes, dono de uma loja de tecidos em frente à praça
“Este é um espaço cultural, para eventos e feiras de artesanato. Agora, estão vilipendiando mais um espaço do Guará, destruindo a praça para a construção de um quiosque. Há anos solicitamos a construção de um estacionamento, paralelo à pista, que não afetasse a estrutura da praça e foi negado justamente por conta da necessidade de se preservar o espaço. E agora começam a construir no local. Não sei quem está construindo e não tenho nada contra a pessoa, mas é preciso defender que a praça continue exercendo a função para a qual foi construída”, defende o comerciante Jonatas Bibas, há 35 anos trabalhando no coração comercial do Guará I.
Estranha autorização

Ao ser informada, a Administração do Guará descobriu que uma autorização para realocação de um quiosque realmente havia sido emitida para o local. Segundo o órgão, a autorização foi assinada pelo ex-administrador regional Roberto Nobre, no dia 29 de dezembro de 2022, dois dias antes de terminar sua gestão. Procurada pela reportagem do Jornal do Guará, a Administração Regional não quis informar quem é o beneficiado com a obra, tampouco forneceu uma cópia da autorização, mas confirmou a sua existência e que o permissionário deveria ter aguardado o alvará de construção para iniciar a obra.
O engenheiro responsável pela construção é Luciano Meira, que confirmou que possui uma autorização da Administração Regional, mas se negou a informar quem o contratou para a empreitada.
Com a reclamação dos comerciantes, e as cobranças da imprensa, a Administração Regional solicitou a retirada dos tapumes e do material de construção do local, concluída nesta quinta-feira, 8 de junho. Restaram apenas os buracos no pavimento de pedra portuguesa. Mas, o engenheiro Luciano Meira confirmou que a obra será retomada assim que o alvará de construção seja expedido, o que já foi solicitado à Administração Regional.

Área nobre e patrimônio cultural

O local escolhido causou estranheza por dois motivos: espaço é uma das áreas mais nobres do Guará. Recentemente, a CEB vendeu um terreno bem ao lado por R$ 2,5 milhões e a Terracap ofereceu um terreno de um quiosque na região, com apenas 45m², por R$ 200 mil em 2019. O quiosque na QE 20, bem em frente à QE 7, estaria em uma das áreas mais valorizadas da cidade.
Outro motivo preocupante é que a praça é um equipamento cultural, devidamente inaugurado como tal pelo poder público em 1995. Segundo a Lei Orgânica do Distrito Federal e a Lei Orgânica da Cultura do Distrito Federal, os espaços culturais recebem proteção especial. Não podem ser ocupados definitivamente sem a anuência do Conselho Regional de Cultura e não podem ser extintos sem a construção de um outro espaço equivalente. Um quiosque na Praça da Feira de Arte e Cultura certamente impediria que a praça fosse utilizada adequadamente. A autorização para a realocação do quiosque para o local, portanto, é ilegal, por ferir a Lei Orgânica.

O gerente de cultura do Guará, Julimar dos Santos, esteve na praça e lamentou a construção. Segundo ele, há projetos culturais em andamento para utilização do local, em especial para incentivar a economia criativa, em parceria com o Sebrae e com produtores locais. Tramita ainda um projeto de revitalização e ocupação cultural da praça, com plantio de mudas do cerrado e realização de feiras de artesanato e apresentações culturais