Guará já não tem mais o icônico “lobo da colina”, apelido do Clube de Regatas Guará, campeão brasiliense de 1996, que morreu há mais de dez anos. Mas, mesmo não tendo o apelo do time de futebol, a cidade passa a ter um novo time campeão brasiliense, mas de queimada, uma modalidade esportiva que já foi muito praticada nos anos 60 a 80 e que vem ganhando corpo no Distrito Federal.
O Felinas, representante oficial da cidade, foi o campeão do torneio Esquenta Candangão de Queimadas, uma espécie de campeonato brasiliense da modalidade, disputado durante dois meses por 28 equipes femininas e 24 masculinas, organizada pela Federação Candanga de Futsal, que representa também a queimada. Depois de vencer uma das duas chaves na fase preliminar e passar pelas quartas de final e semifinal, o time guaraense venceu na final o Walkírias, de Ceilândia, e ficou com o título. O time guaraense já venceu outras competições, mas este agora é o mais significativo.
O título, entretanto, não esconde as dificuldades que o time enfrenta para competir. Formado por 17 atletas de 15 a 47 anos, entre estudantes, donas de casa, empresárias e profissionais liberais, o Felinas tem que se virar internamente para cobrir seus custos. De acordo com a coordenadora do time, Jéssica Martins, o máximo que o esporte tem conseguido é patrocínio para a realização de competições, o que inclui gastos com arbitragem e organização. “Precisamos de apoio e patrocínio para o time, para aquisição de material e pagamento de profissionais da área, porque até agora temos que nos cotizar e muito raramente conseguimos ajuda para comprar uma bola ou algum material mais barato”, diz ela.
O Felinas surgiu do Zoe, um projeto social criado há oito anos e voltado para oferecer oportunidade para mulheres em situação de rua ou em situação de vulnerabilidade, através de atividades de lazer, no caso, a queimada. Além do Felinas, time voltado para competições, o Zoe gerou também o Luna´s, somente para praticar a queimada como lazer. Depois de “parir” os dois times, a instituição Zoe se prepara para implantar um projeto mais amplo, que é levar a queimada para as escolas públicas do Guará e do DF como atividade física curricular.
Como surgiu o Zoe
“Já que o homem tem o dia de futebol com os amigos – e é legal ter essa distração e interação com outras pessoas – por que a mulher também não pode ter?”, pergunta Jéssica, uma das fundadoras do Zoe Queimadas. Entretanto, com o crescimento da adesão, o Zoe foi se expandindo para outros polos em busca de mais espaço. Antes de vir para o Guará, o projeto também passou por Taguatinga e Ceilândia. “O que antes era somente um projeto social, cresceu, praticamente se profissionalizou e passou a competir. Daí, resolvemos montar um time para competição”, acrescenta.
Ajudou nesse desenvolvimento, o reconhecimento oficial da queimada como modalidade esportiva, através da Lei 6.736/2020 (Jéssica tem, inclusive, o número da lei tatuado no braço). “Você trabalhar com o social é dar uma atenção pessoal, já que as pessoas, muitas vezes, saem de um quadro de depressão ou término de um relacionamento conturbado e encontram uma ‘válvula de escape’ na queimada, ou em qualquer outro esporte”. teoriza a coordenadora. Segundo ela, passaram pelo grupo mais de 200 mulheres nesses oito anos de existência do Zoe.
Luna’s é só lazer
Já o Luna´s Queimadas é uma espécie de dissidência do Felinas por não concordar em praticar o esporte como competição, mas também é originário do projeto Zoe. De acordo com a coordenadora do Luna´s, Layanne Gasel, o objetivo do grupo é praticar a queimada apenas como hobby, a exemplo das “peladas” do futebol amador. “No nosso caso, participa quem quiser, independente de experiência, de qualidade técnica e sem preocupação de competir”, define.
Os dois grupos treinam em dias e espaços diferentes: enquanto o Luna´s exercita no Parque Ezechias Heringer, o Parque do Guará, às quartas, e no Centro de Ensino Fundamental 10 (QE 46), às segundas, à noite, o Felinas treina no Centro de Ensino Fundamental 8 (QE 13), às terças, e na Arena Guará (antigo Colégio Maxwuell, na QI 11 do Guará I), às sextas, também à noite. É lá no ginásio coberto da antiga escola que o time sedia seus jogos no Guará.