A Câmara Legislativa promoveu audiência pública no dia 28 de setembro nesta para discutir a infestação de carrapatos-estrela no DF. A iniciativa do debate foi do deputado Ricardo Vale (PT), que cobrou uma política clara para evitar que doenças vindas de carrapatos, que está proliferando em outras regiões, não cheguem no DF. A audiência colheu ainda contribuições ao projeto de Lei nº 616/2023, de autoria do próprio Vale, que lista uma série de medidas de manejo das capivaras e controle populacional.
Em seu pronunciamento, o parlamentar reforçou que “o problema não são as capivaras, e sim os carrapatos”, sendo inviável tomar atitudes que penalizem os bichos. “A gente escuta algumas autoridades do Governo dizendo que a quantidade populacional de capivaras é a mesma e pessoas dizendo que as capivaras estão invadindo a área urbana, indo nos clubes, atravessando pistas. Precisamos tranquilizar a população sobre isso.” Nos últimos meses, três capivaras foram flagradas na área urbana do Guará, o que nunca havia acontecido antes.
Capivara e Febre
O pesquisador e autor do livro “Capivara”, José Roberto Moreira, disse que em estudo solicitado pela Secretaria do meio ambiente do DF, “não houve constatação de febre maculosa na Capital”. A pesquisa, que durou um ano e foi realizada na beira do Lago Paranoá, investigou capivaras e carrapatos.
José também acrescentou que a febre maculosa se encontra em maior número de infecções perto da Mata Atlântica. Além disso, a bactéria que causa a doença também é letal para os hospedeiros que morrem antes de infectar um ser humano, “que por sua vez só faleceria se fosse infectado por muitos carrapatos.”
Outro ponto apresentado por José é referente a proposta de controle da população de capivaras. Para ele, esse controle não é útil já que não causaria efeitos de diminuição de proliferação mesmo com processos de castração.
“Se removermos uma parte da população de animais, a gente deixa disponível para os animais que ficam muito mais alimento, parceiros e recursos do ambiente o que causa um aumento populacional das capivaras. Uma possível solução seria vasectomia ou laqueadura, mas a castração não é o caminho pois outra capivara macho dominaria o grupo e continuaria a prole.”
A secretária executiva de Estado do meio ambiente e proteção animal do Distrito Federal (SEMA-DF), Luiza Helena Rocha da Silva, concordou com José e acrescentou que o assunto só ganhou força devido à mídia dada aos casos de Campinas (SP). Para ela, que é bióloga e veterinária, o controle das capivaras é complicado pois é difícil manejá-las.
“Lá em São Paulo, por exemplo, fizeram castração em algumas áreas e isso dividiu um grupo de capivaras, formando dois grupos com fêmeas e novos machos se cruzando. A laqueadura e a vasectomia são uma opção, mas na minha visão as capivaras estão protegendo o DF de ter casos de febre maculosa. Se tirarmos, virão animais de outros locais, como do Goiás, que já teve casos da febre.”
Ana Paula Vasconcelos, advogada da Comissão de Direito Animal da OAB-DF, disse que o assunto é de extrema relevância para sociedade e principalmente para os animais. Para ela, a sociedade é quem invadiu o espaço dos bichos com a orla do Lago sendo ocupada desordenadamente durante anos.
“Não podemos ‘vilanizar’ as capivaras e temos que achar uma solução pensando no bem-estar delas. Eu vejo que a situação das capivaras traz comoção, porque atinge uma população de alta renda por isso causa tanto incômodo. Se conseguirmos um método mirabolante para exterminar as capivaras, nós teremos um desequilíbrio ambiental muito grande e teremos outros problemas maiores.”
Reclamações
O advogado e engenheiro florestal, Newton Lins, afirmou que desde que o DF começou a ser formado, houve perda das zonas de amortecimento dos habitats naturais dos bichos do Cerrado. Para ele, o Governo tem grande responsabilidade em não ter um órgão de Meio Ambiente, como o Instituto Brasília Ambiental, competente para lidar rapidamente com esses assuntos.
“O Governo do Distrito Federal não pode mais usar os órgãos de ambientação como cartórios apenas para as questões imobiliárias. Precisamos fortalecer áreas científicas para que nós estejamos preparados se aparecer a febre maculosa e evitar a morte de pessoas. Não estamos discutindo a presença do carrapato ou da febre maculosa, mas de um desequilíbrio ecológico.”
Governo
Em resposta às questões levantadas durante a audiência, o subsecretário de vigilância e saúde do DF, Divino Valério, acrescenta que com a globalização e advento da internet, houve celeridade de comunicação na mídia e até falsas informações e pseudos informações, o que causa histerismo.
“Para vocês terem uma ideia, quando tem rumores de determinado agravo antes mesmo que a saúde comece a fazer o processo de investigação de campo já divulgam até resultado e já nos acusam inclusive de omissão.” O subsecretário também citou que um dos principais desafios que a saúde tem é a incompatibilidade do que se tem nas leis com os processos biológicos, o que causa um “delay de resposta”.
“Nós temos que concentrar esforços e aprimorar a legislação para darmos respostas em tempo hábil. Nós da Secretaria de Saúde temos protocolo de resposta para 69 agravos, porém só podemos adotar qualquer protocolo de resposta uma vez que um caso seja confirmado aqui do DF.”
O presidente do Instituto Brasília Ambiental (IBRAM-DF), Rôney Nemer, conclui que com as informações rápidas na internet, é complicado agir e falar sobre assuntos. Para ele, a pauta não deveria ser das capivaras, mas sim dos carrapatos.
“Éguas, cavalos, cães, gatos e roedores também são hospedeiros, então achar que é só a capivara que transporta o carrapato-estrela é insano, pois daqui a pouco nós vamos ter gente fazendo tiro ao alvo. O que eu sempre falo é, cuidado com seus animais, por exemplo, cachorros tem que andar em guias para não ter risco de passar em locais com o carrapato.”