O aumento de 646% dos casos de dengue no Distrito Federal em um ano, de acordo com o Boletim Epidemiológico da Secretaria de Saúde de 23 de janeiro, está provocando a convocação de uma verdadeira artilharia para atacar o mosquito transmissor por parte do governo e para mobilização da comunidade. E não é para menos. Ainda de acordo com o boletim, foram 16.079 casos prováveis em um ano. Em apenas uma semana, de 14 a 22 de janeiro, a quantidade passou de 7.329 para 16.079, ou seja, mais de 9 mil casos. No DF, o número de infectados chega à média de 700 por dia. Nessa semana crítica, 7.569 pessoas com sintomas de dengue foram atendidas nas Unidades Básicas de Saúde. E mais de 2 mil pessoas receberam hidratação venosa, o primeiro tratamento para a dengue. E o mais grave, segundo o boletim, já são três mortes confirmadas pela doença no DF.
Numa ação parecida com a da Covid-19, o governo do DF resolveu arregimentar todas as suas forças para centrar fogo no mosquito Aedes aegytpi, operação que inclue todos os seus órgãos de atendimento à comunidade nas regiões administrativas. A primeira missão da tropa de choque é conscientizar os moradores da necessidade de ajudar no combate ao mosquito, sob pena dos esforços governamentais não surtirem os efeitos esperados. A segunda é identificar e combater os focos e ampliar o atendimento da rede pública de saúde. A missão foi repassada a todas as administrações regionais, que devem mobilizar todos esses órgãos para as providências.
No Guará, a guerra ao mosquito transmissor foi deflagrada nesta terça-feira, 23 de janeiro, numa reunião convocada pelo administrador regional Artur Nogueira, na Administração Regional, com a participação de representantes dos órgãos setoriais da Vigilância Sanitária, das forças de segurança pública (Polícia Civil, Polícia Militar e Corpo de Bombeiros), da Secretaria de Educação, do Serviço de Limpeza Urbana (SLU) e lideranças comunitárias.
O administrador regional Artur Nogueira abriu a reunião lembrando que a determinação do governo é convencer a população “por bem ou por mal”, ao promover campanhas de conscientização para mostrar os riscos provocados por ações que estimulem a proliferação do mosquito transmissor, enquanto vai apertar o cerco a quem insistir em não obedecer às recomendações, através de multas ou até registros de ocorrêncvias a quem descartar lixo em horários e locais inadequados.
“Da parte do governo, estamos com operações permanentes de recolhimento de lixo e entulho em áreas públicas, promovendo poda e remoção de árvores, e estamos instalando cinco papa-lixo e 30 containers grandes nas áreas mais críticas da cidade, como as QEs 38, 42 e 44, e QE 40/Polo de Moda. Mas nada disso vai adiantar se o morador também não fizer a sua parte. Por isso, vamos agir com rigor com quem não colaborar. Estamos notificando os donos de terrenos vazios para que limpem o mato e retirem focos. Se não tirarem, vamos tirar e mandar a conta pra eles”, afirmou o administrador, ao lembrar que no ano passado a Administração Regional chegou a retirar 190 toneladas de lixo e entulho da QE 38 em uma semana e na semana seguinte tudo havia voltado ao que era antes. No Polo de Moda, a mesma coisa: depois de uma grande campanha de conscientização e recolhimento de lixo numa sexta-feira, a reportagem do Jornal do Guará flagrou a mesma quantidade de lixo e entulho jogada em área pública e nos mesmos locais.
Morador só quer saber do fumacê
A chefe do Núcleo de Vigilância Sanitária do Guará, Herica Cristina Marques, afirmou que a maior dificuldade encontrada pelos técnicos é no acesso aos terrenos vazios e cercados, imóveis fechados e até pela resistência de moradores em permitir a vistoria em suas casas. Segundo ela, a maioria dos moradores insiste no “fumacê”, acreditando que o inseticida é a única solução para evitar a proliferação do mosquito e da dengue. “Temos procurado explicar que não se combate a dengue com veneno, mas com prevenção. Os mosquitos que não forem mortos pelo fumacê vão continuar botando seus ovos. Além disso, o veneno acaba matando também as abelhas, que são muito importantes para o meio ambiente”.
Para o representante do SLU para a região do Guará, Emivaldo Batista Neto, a maior dificuldade enfrentada pelo serviço de recolhimento de lixo e entulho na cidade é com a circulação dos caminhões de coleta, principalmente na QE 38 e na QE 40/Polo de Moda, onde as ruas são estreitas e ainda ficam mais estreitas ainda com o estacionamento de carro dos dois lados. “Os moradores preferem culpar o SLU pela sujeira do que fazer sua parte. Muitas vezes o morador descarta o lixo logo depois da passagem do caminhão de coleta, para que seja recolhido no outro dia, o que atrasa o serviço e atrai mosquitos, roedores, cães e outros animais”.
O prefeito comunitário da QE 40/Polo de Moda, Ronaldo Silvestre da Costa, lembrou que, além da falta de conscientização dos moradores, outro grande problema da quadra é a grande produção de lixo por dia. “Existem prédios de quitinetes com até 100 moradores, e se cada um produzir em média três quilos de lixo diariamente, serão 300 quilos, para um local que não previa moradia e ainda com as dificuldades de acesso dos caminhões do SLU”.
Os três representantes dos órgãos de segurança pública do Guará se colocaram à disposição para ajudar na campanha de conscientização e de penalização dos sujões. “O Corpo de Bombeiros pode destacar equipes para ajudar, se necessário. O combate ao mosquito transmissor é uma medida de segurança também”, firmou o comandante do 13º Grupamento dos Bombeiros do Guará, major Alisson Bernardi de Barros. “A Polícia Civil e a Polícia Militar podem ser acionadas nos casos de recusa do morador em abrir sua casa para vistoria dos técnicos da saúde pública, e para multar quem descartar lixo e entulho em locais inadequados, que também é crime”, explicou o delegado adjunto da 4ª Delegacia de Polícia do Guará, Johnson Kennedy.
Para que serve o fumacê
O que mais se vê nos grupos sociais são apelos pela passagem do caminhão que borrifa inseticida nas ruas, conhecidos como “fumacê”, como se fosse a única solução para acabar com a dengue. Mas, o que a maioria não sabe é que o fumacê é apenas um paliativo, porque o inseticida mata apenas os insetos alcançados por ele e mesmo assim só vai fazer efeito se atingir as fêmeas adultas. O mosquito Aedes aegypti é o principal vetor da dengue. O vírus é transmitido para humanos por meio da picada de mosquitos fêmea infectados. Após o período de incubação (4 a 10 dias), um mosquito infectado é capaz de transmitir o vírus pelo resto de vida deles.
O fumacê é uma estratégia encontrada pelo governo para controlar as populações de mosquitos, e consiste em passar um carro que emite uma “nuvem” de fumaça com baixas doses de um agrotóxico que elimina a maior parte dos mosquitos adultos presentes. Esta é uma técnica muito utilizada durante períodos de epidemia para eliminar mosquitos e evitar a transmissão de doenças como a dengue, a Zika ou a Chikungunya.
Embora não seja a forma mais segura de eliminar mosquitos, é bastante rápida, fácil e eficaz, tornando-se uma das principais armas usadas contra os mosquitos. Geralmente, a dose usada em uma aplicação é segura para a saúde humana, no entanto, se a aplicação for muito frequente, o agrotóxico pode ir se acumulando no corpo, causando alguns danos no sistema nervoso.
“Esse serviço serve para eliminar o máximo possível das fêmeas infectadas, cortando a transmissão do vírus. Fazemos um raio de 2 km a partir do local em que foram registrados casos de dengue para fazer o cerco contra o mosquito”, explica o coordenador de controle químico e biológico da Diretoria de Vigilância Ambiental em Saúde do DF, Reginaldo Braga.
Segundo o agente, a aplicação ocorre preferencialmente das 4h às 6h e das 17h às 19h e não é feita quando está chovendo, uma vez que a precipitação impede a circulação da fumaça. “É preconizado pelo Ministério da Saúde e pela Organização Mundial da Saúde que é na mudança de clima, do quente para o frio e do frio para o quente que a fêmea sai do repouso dentro dos lares para fazer o repasse do sangue no raio de 500 metros. Ou seja, são nesses horários que precisamos atuar para impedir a circulação dela”, esclarece Braga.
Ações de combate
Além do fumacê, outras ações de combate estão sendo adotadas pelo GDF, como o manejo ambiental, o controle químico, as inspeções dos agentes de vigilância a residências e o investimento em novas tecnologias, como as armadilhas ovitrampas.
Para ajudar no atendimento aos pacientes com sintomas, foram implantadas tendas de acolhimento ao lado das administrações regionais das cidades com maior incidência da doença atualmente – o Guará ainda não recebeu. O serviço está disponível desde o20 de janeiro), das 7h às 19h, em Ceilândia, Sol Nascente/Pôr do Sol, Samambaia, Sobradinho, São Sebastião, Estrutural, Recanto das Emas, Brazlândia e Santa Maria. Nos locais são oferecidos testes rápidos de dengue, acolhimento de pessoas com sintomas e hidratação dos pacientes com a doença, além de informações sobre combate ao mosquito, descarte correto de lixo e espaço para denúncias de locais com possíveis focos.
Quem estiver com sintomas de dengue devem procurar a Unidade Básica de Saúde (UBS) mais próxima, diante dos primeiros sintomas da doença, como febre alta (acima de 38ºC), dores no corpo, nas articulações, atrás dos olhos, mal-estar, falta de apetite, cefaleias e possíveis manchas vermelhas pelo corpo. Caso os sintomas apresentados sejam graves – dores intensas na barriga, vômitos persistentes, sangramentos no nariz, na boca ou nas fezes, tontura e cansaço extremo –, a orientação é procurar uma Unidade de Pronto Atendimento (UPAs), que excepcionalmente estão abertas aos sábados, das 7h às 12h ou das 7h às 19h, e outras com horário ampliado de segunda a sexta-feira, das 7h às 22h.
Dengue clássica ou hemorrágica: entenda a diferença e os sinais de alerta
Enquanto a primeira estaciona nos principais sintomas, como febre e dores no corpo, a segunda é a evolução para o quadro mais grave que pode acontecer mais comumente entre o 3º e 7º dias
O aumento do número de casos de dengue no Distrito Federal acende o alerta para que a população esteja atenta aos primeiros sinais da doença e evite o agravamento da enfermidade. A arbovirose urbana transmitida pela picada da fêmea do mosquito Aedes aegypti tem quatro sorotipos diferentes, e todos são capazes de causar desde a dengue clássica até a grave, que é mais conhecida como hemorrágica.
Os primeiros sintomas de dengue aparecem entre quatro e dez dias depois da picada do mosquito infectado. Os sinais mais comuns são mal-estar, fadiga, febre alta (acima de 38ºC e que se inicia ao final do dia), dor no corpo, dor retro-ocular (atrás dos olhos), dor de cabeça e dor nas articulações (em locais como joelhos e cotovelos). Vômito, náusea, diarreia e manchas no corpo também podem ser identificadas em alguns pacientes. Há ainda casos assintomáticos ou com a presença de apenas um sintoma.
Tanto a dengue clássica quanto a grave têm os mesmos sintomas nos primeiros dias. A diferenciação ocorre mais frequentemente entre o terceiro e o sétimo dia, quando a febre cessa. No caso da dengue hemorrágica, aparecerão alguns sinais de alerta.
“O início dos sintomas é parecido. A partir do terceiro dia, a maioria dos pacientes tem uma melhora, com a febre indo embora, mas com a continuidade da dor. Só que tem uma parcela pequena entre o terceiro e o sétimo dia que pode evoluir para a dengue hemorrágica”, explica a médica de família da UBS 2 de Santa Maria, Fabiana Fonseca.
Nos casos em que a doença se agrava, os pacientes podem ter queda da pressão arterial, tontura, dor abdominal, vômito contínuo, pontos arroxeados na pele e até sangramentos na gengiva, boca, nariz, ouvido, intestino, na urina e nas fezes.
A reinfecção de dengue é um dos fatores significativos para o desenvolvimento do quadro de dengue hemorrágica. “A partir da segunda ou terceira vez, a doença tende a ser mais grave. A chance é maior de evoluir para dengue hemorrágica. Por isso é importante ter mais atenção e cuidados, além, claro, da prevenção que depende tanto do governo como de nós mesmos”, afirma a médica. Os mosquitos se reproduzem em locais de acúmulos de água.
A ingestão de anti-inflamatórios também influencia no agravamento por aumentarem o risco de hemorragia. Mulheres grávidas, crianças e idosos também têm mais chances de desenvolver complicações.