Mesmo com dinheiro em caixa, Administração do Guará não cuida de equipamentos públicos

Com mais R$ 400 mil disponíveis em caixa para a reforma de espaços públicos , a Administração do Guará permite a deterioração do mobiliário urbano como prática de gestão

A Administração Regional parece ter buscado inspiração na Rússia para gerir a cidade. E não estamos falando da organização da Copa do Mundo, que começou esta semana na sede da ex-União Soviética. O administrador regional Luís Carlos Júnior escolheu a tática de terra arrasada. A estratégia, usada pela Rússia na Segunda Guerra Mundial, consistia em destruir e desocupar as terras que irremediavelmente seriam conquistadas pelos inimigos. Assim, quando os adversários adentrassem o território encontrariam apenas cidades destruídas e terras queimadas, ou seja, não teriam conquistado nada.

Na véspera de decidir se o PRB (o partido do administrador do Guará, do seu padrinho político, Rodrigo Delmasso, e da maioria dos servidores comissionados do órgão) continua na base do governador Rodrigo Rollemberg ou disputa as eleições na oposição, a decadência toma conta dos espaços públicos e mobiliário urbano. Alguns equipamentos, como parquinhos e alambrados, têm sido arrancados pela Administração, sob o argumento que serão reformados e jogados como entulho no pátio de obras do órgão. Existe dinheiro liberado no orçamento da Administração do Guará justamente para a reforma e manutenção destes equipamentos, mas por conta da falta de tempo e do impedimento de realização de licitação em período eleitoral, serão provavelmente devolvidos ao cofre do governo.

 

Gato de energia

A deterioração de equipamentos públicos tem atingido especialmente as estruturas de cultura e lazer da cidade. A nova Casa da Cultura do Guará, inaugurada há apenas seis anos, é vítima do descaso. O local continua, desde a inauguração sem acesso à internet ou rede de telefonia. Mas, o maior problema atualmente é que nem mesmo energia elétrica há no local. A Casa da Cultura é abastecida por um cabo ligado diretamente no poste próximo ao estádio. Não há relógio medidor no local e não se sabe se a Administração tem autorização da CEB para fazer o gato ou se paga pela energia consumida. O Teatro de Arena do Guará, outrora palco de grandes eventos, sobre do mesmo abandono.

Ligação clandestina é a única fonte de energia elétrica da Casa da Cultura do Guará, inaugurada há seis anos

O administrador Luís Carlos Junior explica que a instalação clandestina de energia elétrica que alimenta a Casa da Cultura justifica-se por conta de falhas no projeto de construção da estrutura. “A Administração está sanando vários problemas oriundos durante o período de construção da nova Casa da Cultura, dentre a falta de quadro de energia próprio que a atual gestão está providenciando”. Sobre a falta de internet e telefonia no local, a Administração afirma que está realizando “um estudo de viabilidade sobre a melhor forma de disponibilizar a rede de internet aos frequentadores para pesquisa e consulta”, seis anos após a sua abertura ao público.

A antiga Casa da Cultura tem sido reformada por alguns artistas e produtores locais de forma artesanal. A estrutura foi condenada no passado pela Defesa Civil, o que motivou a construção de uma nova Casa da Cultura. O administrador afirma que novos laudos garantem a viabilidade da estrutura que passou quase 30 anos sem manutenção. Os laudos foram solicitados pelo Jornal do Guará e não foram apresentados.

Manutenção das vigas que sustentam o telhado da antiga Casa da Cultura é feita por voluntários amadores, com anuência da Administração do Guará

Ainda que em um gesto de boa vontade e iniciativa pública, a reforma não conta com o acompanhamento de engenheiro ou qualquer medida de segurança. Até as vigas que sustentam o telhado têm sido emendadas pelos voluntários. Administração também nega que tenha cedido o espaço para qualquer grupo, ainda assim, as intervenções continuam. Segundo o órgão, “a revitalização acontece como uma iniciativa de mutirão de limpeza, e que por se tratar de prédio público com interesse cultural para toda a população, os cidadãos são livres em sua expressão. Moradores voluntariamente se dispuseram a auxiliar, entretanto, não há cessão de uso, pois para isso seria necessária a realização de um chamamento público”. O Conselho de Cultura do Guará, órgão consultivo e deliberativo da área na cidade, já se posicionou contra a reforma da forma que está sendo feita.

 

Teatro do Guará

Pensado para abrigar projetos de grupos cênicos da cidade e pequenos shows, o Teatro do Guará, localizado dentro da Administração Regional, foi palco de dezenas de companhias teatrais locais e apresentações de artistas como Ângela Ro Ro, Miúcha, Celso Blues Boy, Roberto Menescal, Beto Guedes Tunai, Tetê Espíndola e muitos outros. Hoje, com parte dos aparelhos de ar condicionado em péssimas condições, gotejando dentro da sala fechada, carpete mofado, cadeiras quebradas e banheiros quase sem condições de uso, o espaço recebe apenas Audiências Públicas e reuniões políticas, que se intensificaram com a proximidade do ano eleitoral. “O auditório também integra as prioridades do órgão e está incluso na programação de revitalização do prédio”, explica a Administração do Guará.

 

Parquinhos

Parquinho retirado do Parque Ezechias Heringer para suposta manutenção virou sucata

Esperando uma licitação de compra de parquinhos infantis, de R$ 636 mil, feita pela Novacap, o administrador regional Luis Carlos Júnior ordenou a destruição dos parquinhos existentes em alguns locais. Foram retirados o parquinho dentro do Parque Ezechias Heringer, único parquinho da cidade adaptado para cadeirantes, e do da Praça Itajubá na QE 40. Os dois equipamentos foram destruídos e não podem ser recuperados. Em um primeiro contato, quando questionado sobre a retirada do parquinho da QE 40, doado por empresários da cidade, o administrador garantiu que seria apenas retirado e substituído por outro pela Novacap. Mas, na verdade o parquinho foi inutilizado, com todas as suas barras de sustentação cortadas e vários metros de corrente dasapareceram. A Administração argumentou que um laudo de engenheiro do órgão atestava o risco do parquinho feito com pneus e barras de ferro na QE 40.

Parquinho da praça Itajubá, na QE 40, foi destruído durante a retirada. Até hoje apenas um banco de areia é a opção de lazer para as crianças na praça

Solicitada formalmente, a Administração mais uma vez recusou-se a apresentar este laudo. No local onde estava resta apenas um banco de areia. Em nota a Administração Regional do Guará explica que a demora para a instalação é por conta da “construção da base, chumbamento e montagem, e (as obras) já  foram iniciadas em regiões como o Parque Denner”.

 

Salão Comunitário da QE 42

Construído como forma de unir a comunidade e descentralizar as ações culturais do Guará, o Salão comunitário da QE 42, ou do Parque JK, passou boa parte do ano fechado à comunidade. “Em virtude da falta de manutenção por parte dos antigos gestores, o local apresentava problemas estruturais que comprometiam a segurança dos frequentadores, como os vazamentos e outros problemas. Entretanto, essa gestão por meio de suas equipes de manutenção e conservação já sanaram essas pendências e o local já está sendo disponibilizado à comunidade, conforme as solicitações protocoladas ao órgão”, afirma a Assessoria de Comunicação Social do órgão. Ainda assim, várias lâmpadas e tomadas ainda não funcionam. Ao lado, a entrada do parque continua em ruínas, sem ter recebido nenhuma atenção nos últimos anos.

Salão Comunitário na QE 42 em condições precárias

 

Dinheiro sobrando

A crise financeira que vive o Distrito Federal e o país poderia ser desculpa para o abandono dos prédios. Mas, no orçamento da Administração do Guará consta desde janeiro mais de R$ 400 mil para a “Reforma de Prédios e Próprios da RA-X”. A fonte deste recurso é a arrecadação direta, ou seja, as taxas recolhidas pela própria Administração do Guará. Estes R$ 400 mil não são fruto de emenda de nenhum parlamentar e nem são um favor do governo para o Guará. Nenhum centavo desde recurso foi licitado até o momento, e, com a proximidade das eleições, não há mais tempo para utilizá-lo em 2018 (pelo menos até o fim das eleições). Este valor consta no orçamento como “Despesa Autorizada”, assim poderia ter sido utilizado em sua totalidade ou parte a qualquer momento, desde janeiro deste ano. Sem detalhar como, o administrador apenas afirma que “está em andamento projeto que dá continuidade às benfeitorias iniciadas para que os recursos sejam aplicados da melhor forma para atender a comunidade”.

A Administração Regional do Guará já gastou mais de R$ 3 milhões no pagamento de seus funcionários até o fim do mês passado. Este valor vai pelo menos dobrar até o fim do ano. Os únicos investimentos feitos até agora pelo órgão no Guará foi a realização da Virada Cultural Gospel e outros eventos no mês de aniversário do Guará, que consumiram mais de R$ 100 mil, e o pagamento de contas de água, luz e telefone do próprio órgão. Além de poucas aquisições como a compra de R$ 2.114 em café, quase R$ 4 mil em papel e R$ 1.356 em bonés e camisetas. Enquanto isto, a cidade perece sob a ação do tempo e da inércia política.