“Não se pode ter administradores escolhidos apenas pelo dedo do governador. Eles precisam ter vínculo com a população. A participação dos moradores na indicação é importantíssima. Vou ouvir a população. Será definida uma lista tríplice e dos três nomes vou indicar um. E os moradores vão avaliar os administradores. Vou dar todas as condições para eles trabalharem, mas se forem mal avaliados, serão retirados, e a população indicará outro nome.”
Essa declaração do governador eleito Ibaneis Rocha na primeira entrevista após a eleição provocou um alvoroço no meio das lideranças comunitárias. Faltando dois meses para a posse do novo governo, a promessa desencadeou uma corrida pelo cargo em todas as cidades do DF. O interesse aumentou mais ainda porque, na esteira da promessa, o novo governador garante que vai fortalecer as administrações regionais, com a volta do poder de fiscalizar, de aprovar licenças e projetos e ampliar os serviços aos moradores.
Ainda não é a eleição direta prometida por Rollemberg, mas é uma abertura para a comunidade se manifestar sobre a escolha do principal representante do governo na sua cidade. Difícil será encontrar uma fórmula para fazer essa consulta, e depois a escolha, sem correr o risco de indicar quem tenha feito oposição ao governador eleito durante a campanha ou que não esteja afinado com suas ideias.
Outra questão é: a quem consultar? Diante da impossibilidade técnica de ouvir todos os moradores, restaria ouvir as instituições organizadas da cidade. Difícil será definir parâmetros sobre a representatividade de cada uma. Um exemplo são as igrejas evangélicas. Somente no Guará, existem mais de 50. Se forem dadas a cada uma delas o mesmo peso de outras instituições, o escolhido será um representante do meio. Se não for, quantos representantes no conselho de votantes elas teriam direitos? E como escolher esses representantes, dada à diversidade de interesses e ideias entre elas?
Ouvir aliados?
A julgar pelo movimento dos pré-candidatos ao cargo, Ibaneis não terá como fugir da pressão dos aliados, sejam eles interessados diretamente no cargo ou parlamentares que gostariam de apadrinhar seus afilhados.
A ideia de ouvir a comunidade não é nova e já foi tentada outras duas vezes. A primeira no segundo Governo Roriz, quando foi feita a mesma promessa e abriu-se uma lista de interessados. O escolhido foi Heleno Carvalho, afilhado do então deputado distrital eleito Izalci Lucas, que tem a cidade como seu reduto eleitoral. A lista foi apenas um subterfúgio para dar caráter de democracia à escolha, porque já se sabia que Heleno seria o escolhido. Foi um jogo de cartas marcadas.
A segunda aconteceu no início do Governo Rollemberg, quando o comando da cidade foi oferecida à deputada Celina Leão, presidente da Câmara Legislativa e na época aliada do governador eleito. Celina aceitou a oferta, mas condicionou a escolha às sugestões da comunidade através de uma lista tríplice. O editor do Jornal do Guará, Alcir de Souza, foi encarregado pela deputada de promover essa filtragem com as lideranças comunitárias da cidade. Mas, após cinco reuniões e intensos debates, a lista foi fechada com 16 candidatos, inclusive quem tinha feito oposição ao governo eleito. Como não houve consenso para filtrar apenas três, a lista foi levada à deputada, que preferiu não se desgastar politicamente com a população diante de tanta intransigência, e preferiu devolver a deferência ao governador. Rollemberg então entregou o controle da cidade ao deputado distrital Rodrigo Delmasso, que indicou André Brandão para o cargo.
Candidatos avulsos
A senha anunciada por Ibaneis desencadeou uma corrida pelo cargo. Nas redes sociais começaram a surgir indicações e candidaturas, enquanto outros procuram se cacifar com parlamentares da base do novo governador.
A ideia pode provocar uma saia justa para Ibaneis. Entre os favoritos em qualquer consulta está o ex-administrador regional André Brandão, com bom trânsito entre as lideranças locais e cacifado pelos 4.600 votos que conseguiu como candidato a deputado distrital. Desafeto do deputado reeleito Rodrigo Delmasso depois de se afastarem no final do ano passado após três anos de parceria, André provavelmente teria seu nome vetado pelo parlamentar, que deverá ser um dos principais aliados de Ibaneis na Câmara Legislativa, inclusive com possibilidade de assumir a presidência da casa.
Se optar por ouvir indicações de aliados, um dos nomes a ser colocado na mesa será o do líder comunitário e pioneiro da cidade João Paixão de Lima, que coordenou as campanhas do senador eleito Izalci Lucas e da deputada ederal eleita Flávia Arruda no Guará. Indicar um afilhado do senador que será seu principal interlocutor no Senador, e de uma deputada aliada na Câmara dos Deputados, seria uma tacada dupla de Ibaneis. Outro coordenador de campanha vitoriosa no Guará e candidato ao cargo é Samuel Lima, o Samuca, indicação do deputado distrital reeleito Robério Negreiros, também da próxima base aliada do governador na Câmara Legislativa.
Surgiram outras candidaturas espontâneas nas redes sociais, como a da professora Gicileide Ferreira, que teria a simpatia de Rodrigo Delmasso. Também se apresentou a ex-diretora da Regional de Ensino do Guará, professora Maria Nazaré, irmã do ex-administrador regional Divino Alves dos Santos, ex-presidente regional do MDB, o mesmo partido de Ibaneis e a professora Verônica Portássio. Outras duas candidatas potencias são Vânia Gurgel, que obteve quase 5 mil votos para deputada distrital, e Tânia Coelho, candidata a distrital pelo PSC, um dos partidos que fizeram parte da coligação de Ibaneis Rocha. A “bolsonarista” convicta Pat Veras e o agitador cultural Miguel Edgar também estão colocando seus nomes para apreciação, mas com menor chances, principalmente Miguel, militante do PT e coordenador no Guará da deputada federal reeleita Érika Kokay. Quem também está se apresentando como candidato é o bombeiro militar e ex-conselheiro tutelar Jeferson Maximino, que foi candidato a deputado federal nestas eleições.
Outro nome sugerido nos grupos de WhatsApp da cidade é do ex-administrador regional e colunista do Jornal do Guará, Joel Alves Rodrigues, de bom trânsito entre as lideranças locais, mas ele próprio já descartou o interesse de voltar ao cargo.
Este, portanto, é o cenário para Ibaneis no Guará, qualquer que seja a fórmula da escolha do novo administrador regional. Para mais dois meses de discussão.