AINDA ONTEM SOBRE OS MAGRELOS

Os Magrelos no Guará 1, nos tempos dos eucaliptos Renato, Luidi, Rich, Cécé e Clevinho. Sobreviventes, Renato & Rich Os Magrelos no Guará 1, nos tempos dos eucaliptos Renato, Luidi, Rich, Cécé e Clevinho. Sobreviventes, Renato & Rich

No final dos 70s, só existia uma banda de rock em atividade na QE 36, anos depois ela atrairia músicos de outras quadras. No Guará 1, havia Os Magrelos, primos dos primeiros punks da capital.
Ouvi falar d’Os Magrelos ainda em 1983, nos autofalantes de um concerto da Plebe Rude em cima do caminhão na Chaplin na 109 Sul. Concerto esse onde a anunciada Legião Urbana não tocou: “Corrigindo, corrigindo Os Magrelos não são de Taguatinga e sim do Guará” foi a reverberação no autofalante.
Os Magrelos pegaram a ressaca dos dez anos de Woodstock em 1979. Nas caixas de som deles, curtiam Casa das Máquinas, Made in Brazil, Patrulha do Espaço, Status Quo, Joe Perry Project, MC5, Stooges, Vibrators, Stranglers… As informações vinham da escola. Curtiam desenhar, tocar e teatro e marcavam presença nas manifestações como Concertos Cabeças e na Concha Acústica.
O filme Christiane F. decidiu o caminho de muitos que o assistiram. Os Magrelos não foram exceção. Isolados assistimos ao filme no mesmo cinema que existia na QE 7 do Guará 1.
Nas festas, a entrada deles era apocalíptica: em fila, um por um, entravam correndo com os calcanhares tocando nas pontas dos dedos das mãos voltadas para trás e formavam a roda. Seus jeans, os mais sebosos, e suas camisetas, as mais coloridas e os maiores pelos.
Os Magrelos eram lendas em seu próprio tempo – eram os boêmios errantes, com tempo inimaginável de estrada e aventuras – era a geração mais corajosa que eu conheci – não eram da idade dos caras dos bailes e não voltaram desiludidos da estrada – era uma geração jovem irrequieta e a fim de conhecer o desconhecido de questionar seus pares; e o engraçado era que os pais deles compreendiam essa ansiedade – queriam o novo e sabiam que o novo vinha do velho – Os Magrelos moravam num arrabalde do Guará 1, na parte leste de onde dava para ver o trem que seguia para Minas antes de chegar em São Paulo.
O rock estava fodido – era coisa de marginais, de delinquentes. Então, contra todos os acordes progressivos do horizonte, os punks davam início àqueles festivais do começo do fim do mundo (era a novidade). Lançavam os compactos do Lixomania, e Botas Fuzis e Capacete do Olho Seco – o negócio era mal gravado, mas era o renascimento de selos como Fermata, que ajudavam os garotos. A onda vinha de Curitiba, do Bexiga. Aqui, melodia era o canto dos pássaros (falava-se de dodecafonismo a Zappa), então essa rapaziada jogou fora os discos de Minas, pisou nas flores do Vandré como velório da ditadura – e curtiu uma com o sambão.
Dezembro de 1982 ou a última foto inédita d’Os Magrelos que apareceu! Suas ações chegariam à posteridade – eles sabiam que seriam imortalizados. Quando viram a foto certificaram: “Para a posteridade!” Suas frases eram cruas e impactantes. Parte da história anda por aí, é uma glória: “O tempo que ainda virá; futuro, porvir”.
Além de seus nomes de batismo, eles atendiam por apelidos como Cabelo, Linha, Fiapo, Osso e por aí vai. E também possuíam codinomes impublicáveis usados somente por eles em suas rodas – naquele período de repressão era norma ter apelidos muitas vezes não curtidos pelas famílias.