A difícil sobrevivência no circo durante a pandemia

Surpreendido pela pandemia no dia 12 março, circo não pode deixar a cidade e nem promover espetáculos. Mas a família e funcionários estão recebendo ajuda da comunidade

Acostumado a aportar aonde é bem recebido pelo público e escolher para onde ir, o Circo Vitória se viu diante de uma realidade única e dura nos seus 27 anos de existência, ao ser pego de surpresa pela pandemia do coronavírus quando se apresentava no Guará há mais de dois meses e se ver obrigado a não deixar a cidade e, pior, suspender seus espetáculos. Sem perspectivas de ter a atividade liberada a curto prazo, porque se enquadra nas atividades mais sensíveis à contaminação – as que envolvem aglomeração de público, como são os casos de cinema, teatro, shows, futebol e outros esportes -, o circo deve continuar na cidade por alguns meses. Essa perspectiva – ou a falta dela – poderia provocar desespero nas 20 pessoas que dependem da arrecadação dos espetáculos para continuar sobrevivendo. Mas não está. Embora preocupados com o futuro, as 16 pessoas da família Mocelim e quatro ajudantes resolveram enfrentar a realidade sem lamentações e aproveitar a proximidade com o guaraense para fazer e reforçar amizades – é a terceira vez que aporta no Guará. É dessa relação que os membros do Circo Vitória estão recebendo exemplos de solidariedade através de doações e venda de máscaras de proteção facial que os permitem garantir o sustento do dia a dia.

Amor pelo circo
Criado há 27 anos em São José do Rio Preto, interior de São Paulo, o Circo Vitória foi a afirmação do empreendedorismo de Antenor de Almeida, 82 anos, seu filho Wilson de Almeida, 61 anos, e a nora Louri Mocelim, 59. Antenor trabalhava num circo, onde nasceu Wilson. A gaúcha Louri era uma apaixonada pela atividade circense e após conhecer e se apaixonar por Wilson resolveu segui-lo. Dessa união, vieram três filhos e quatro netos, que teve a adesão na atividade de noras e genros. Todos são crias do Circo Vitória e até hoje continuam a acompanhá-lo.
Porta voz da família, Michelle Mocelim de Almeida, 37 anos, define o que para o público externo pode parecer de difícil compreensão essa paixão por uma vida mambembe, em que se vive apenas o dia a dia. “É um sentimento inexplicável. Só quem vive no circo sabe o que representa esse mundo, que nos dá oportunidade de conhecer tantos lugares, culturas e pessoas diferentes. O trabalho se confunde com o divertimento. Não há rotina”, diz ela. Com efeito, o Circo Vitória somente não passou ainda por Amazonas, Acre e Rondônia no Brasil, mas já perambulou por Uruguai, Paraguai, Chile e Peru.
Até para as crianças a vida circense é divertida, porque a cada porto elas tem a oportunidade de estudar numa escola diferente e conhecer novos colegas – uma lei federal garante vagas em escolas públicas aos filhos de profissionais de circo em qualquer época e local, até o Ensino Médio. Até curso superior é possível fazer, como foi o caso da própria Michele, que concluiu Artes Cênicas nos quatro anos em que o circo ficou em Ribeirão Preto.
Loiri Mocelim, mãe de Michele, transformou a admiração adolescente pela paixão ao circo. “Depois de 40 anos em que estou no Vitória, acho que não saberia viver fora desse mundo, que ensina uma coisa nova a cada dia”, garante a ex-trapezista e domadora de cavalos que agora cuida da parte administrativa e da cozinha e dá suporte à toda a família.


Solidariedade do guaraense
Sem reserva financeira, a família correria o risco de passar dificuldades durante essa parada obrigatória, mas não passou, graças à solidariedade do guaraense. “Está sendo surpreendente o carinho com que estamos sendo tratados aqui. Temos sido abastecidos de doações e muito calor humano”, conta Michele. Mas da quebra de ovos, a família resolveu fazer um omelete. Como precisa de dinheiro para comprar remédio e outras necessidades do dia a dia, a família montou uma fábrica de máscaras de proteção facial (R$ 5 cada), que está servindo também como uma terapia ocupacional para todos, inclusive as crianças. A produção vem aumentando com a demanda, porque as máscaras tem caído no gosto dos compradores pela qualidade do tecido e do acabamento. Além do boca a boca e da recomendação de quem adquiriu, as máscaras estão sendo anunciadas no Facebook, compartilhadas em grupos de WhatsApp e são entregues sem custo no Guará, independente da quantidade.
Para quem quiser ajudar ou adquirir as máscaras, basta contatar Michele, pelo 98191.5121