Após quatro anos de discussão, elaboração de projetos, dinheiro gasto (R$ 360 mil pela elaboração do projeto inicial) e aprovação do Tribunal de Contas do DF, a privatização do Complexo de Esporte e Lazer do Cave pode não acontece mais. Pelo menos se depender da vontade do próprio mentor e padrinho da ideia, o deputado distrital Rodrigo Delmasso (Republicanos). Ele anunciou na tribuna da Câmara Legislativa nesta terça-feira, 9 de fevereiro, que estava solicitando à Secretaria de Esporte e Lazer a suspensão da PPP, alegando distorções no projeto finalizado e já pronto para ser licitado. Durante a fala, Delmasso informou que estava sugerindo a transferência da gestão do complexo para o Sistema “S” (Sesi, Senai e Senac) no modelo “chamamento público”.
De acordo com o deputado, o projeto finalizado pela Secretaria de Projetos Especiais e encaminhado à Secretaria de Esporte e Lazer para licitação tem diferenças do projeto elaborado e apresentado à comunidade, porque penalizaria o morador com ingressos para acesso às atividades acima do poder econômico médio da população guaraense. “Pela proposta, o morador vai pagar em média R$ 50 para usufruir do novo espaço. Além disso, dá direito ao concessionário de construir outros prédios comerciais além dos previstos inicialmente, o que desvirtuaria o projeto original”, garante. “Estou sugerindo repassar o Cave ao Sesi, para que possa implantar lá projetos sociais e esportivos, como acontece no Sesi de Taguatinga, com acesso mais fácil e mais barato aos moradores”, completa.
Delmasso informa ainda que vem negociando com o Sistema S a possibilidade de ocupação do Cave desde outubro do ano passado e que “as tratativas estão adiantadas”. “Se o governo não suspender a PPP do Cave, vamos acionar a Justiça”, afirma o deputado.
Governo ainda não se posicionou
Questionadas pelo Jornal do Guará, as secretarias de Projetos Especiais e de Esportes e Lazer afirmam que ainda não há decisão sobre o pedido do deputado. A Secretaria de Projetos Especiais garante que promoveu apenas ajustes sugeridos pelo Tribunal de Contas do DF, sem alterações significativas das propostas iniciais. No projeto disponibilizado pela Sepes à reportagem, o único valor citado para pagamento pelo uso do novo Cave refere-se ao de sócio do clube social, no valor mensal aproximado de R$ 160. Também não prevê a construção de prédios comerciais além da praça de alimentação e lazer que vai dar suporte ao clube social, e mesmo assim de apenas um piso. A Secretaria de Esporte e Lazer confirma que recebeu o ofício do deputado em nome da Câmara Legislativa e ainda vai analisá-lo. Mas informa que, em princípio, aguarda apenas a demarcação geográfica da área a ser licitada, que é realizada pela Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação (Sedhu) para publicar o edital de licitação, previsto ainda para o mês de fevereiro. Informou ainda que o projeto de privatização do kartódromo Ayrton Senna também está pronto e pode ser lançado logo depois da PPP do Cave.
Pressão e recuo
Delmasso nega que o recuo tenha a ver com a pressão de lideranças comunitárias da cidade, principalmente do segmento cultural – na semana passada, ele desistiu da proposta de transferir o Centro Interescolar de Línguas (Cilg) da QE 7 para o Salão de Múltiplas Funções do Cave depois de repercussão negativa nas redes sociais. Desde quando foi apresentada em 2017, no governo Rollemberg, a proposta de concessão do Cave sofre uma forte campanha de oposição das lideranças comunitárias, em parte pelo temor da comunidade perder o acesso ao espaço e por outro lado por questões meramente ideológicas por aqueles que defendem que o Estado não deve privatizar o que é público. O argumento do governo, e do próprio Delmasso até então, é que a privatização seria a única possibilidade de recuperação do Cave, que está completamente sucateado, com o estádio demolido, o ginásio coberto interditado e as quadras esportivas sem condições de uso. Para completar o argumento, esse sucateamento teria sido provocado pela incompetência do governo em administrar seus espaços públicos, por falta de estrutura – a Administração Regional do Guará, a quem cabe a gestão do Cave, foi esvaziada nos últimos governos e sua estrutura mal é suficiente para manter os serviços mínimos à comunidade.
O projeto de concessão do Cave debatido desde 2017 prevê a reconstrução do estádio do Cave, de um novo ginásio coberto ao lado do Teatro de Arena (onde é a pista de bicicross), a construção de uma praça de lazer no terreno do atual ginásio, com academias, restaurantes e serviços, e um clube social, como meio do concessionário obter retorno dos investimentos, calculados em R$ 35 a 40 milhões (R$ 28 milhões em 2017). Somente no estádio seriam cerca de R$ 14 milhões.
Na entrevista que concedeu ao Jornal do Guará em julho do ano passado, o então secretário de Projetos Especiais, Everardo Gueiros, garantiu que a preocupação do segmento cultural do Guará em relação aos espaços existentes não se justificava, porque a Casa da Cultura e o Teatro de Arena não foram incluídos na privatização. O projeto finalizado prevê a demolição do prédio do Centro de Convivência do Idoso (CCI), mas com a obrigação de ser reconstruído pelo concessionário no lugar do prédio desativado da Casa da Cultura, ao lado do antigo Pontão do Cave. Também será de responsabilidade do concessionário a construção de uma nova pista de bicicross e outra de skate no terreno atrás do posto Petrobrás e entre a Abrace e Centro de Saúde 2.
O projeto prevê também a destinação de 10% das vagas em escolinhas de esporte aos alunos da rede pública de ensino e a reserva de seis datas anuais para a realização de eventos promovidos pela Administração Regional do Guará.
Custo da recuperação do Cave
Os técnicos da Secretaria de Projetos Especiais avaliaram em 2017 que seriam necessários cerca de R$ 28 milhões para a implantação do projeto chamado de “Novo Cave”, valor que poderia chegar hoje entre R$ 35 e 40 milhões. Somente na reconstrução do estádio seriam necessários cerca de R$ 10 milhões há quatro anos. O governo, através da Novacap, chegou a pagar R$ 562 mil na implantação do gramado à empreiteira que ganhou a licitação para a reforma do estádio, mas perdeu a verba de R$ 6,5 milhões destinada pelo Ministério do Esporte para conclusão da obra porque o projeto apresentou erros técnicos que não foram corrigidos a tempo da vigência da disponibilidade dos recursos no Orçamento da União.
De acordo com o projeto aprovado e pronto para a licitação, o novo concessionário terá que investir 24,83% no primeiro ano, 46,26% no segundo ano e 28,91% no terceiro ano, conforme cronograma apresentado. Será priorizado no primeiro ano a elaboração e aprovação dos projetos executivos de engenharia das áreas social e esportiva do novo Clube Vizinhança, a obtenção das licenças ambientais e de instalação das obras, a revisão e complementação do projeto e início da reforma do Estádio Antônio Otoni Filho, a reforma do imóvel que irá abrigar o novo Centro de Convivência do Idoso – CCI e a elaboração dos projetos e construção da nova pista de skate e da nova pista de bicicross. Os recursos para realização do investimento previsto no projeto serão constituídos por 20% de capital próprio e 80% de capital de terceiros.