A cidade vai receber 8 mil novos moradores nos próximos dois anos a três anos em apenas uma nova quadra, a QE 60, que está sendo criada entre a QE 46 e o Setor de Postos, Motéis e Concessionárias. Até aí, nada demais, porque a política do Governo do Distrito Federal é criar novas áreas para abrigar mais de 100 mil inquilinos que demandam casa própria, mas, o que chama a atenção é a alta densidade populacional da nova quadra, parecida com a do Sudoeste. Esses 8 mil novos habitantes vão ocupar uma área de apenas 29 hectares, ou 290 mil metros quadrados, correspondente a 40 campos de futebol. Todos os 103 lotes previstos no projeto são destinados a construções verticais, com exceção apenas de cinco lotes para equipamentos públicos.
Embora prevista no Plano de Ordenamento Territorial do DF (PDOT), aprovado em 2009 e revisado em 2012, a concentração de tanta gente num pequeno espaço preocupa moradores das quadras próximas, que temem caos no sistema viário e sobrecarga na infraestrutura daquele lado da cidade.
Durante audiência pública virtual promovida pelo Instituto Brasília Ambiental (Ibram), nesta terça-feira, 15 de junho, para discutir os impactos ambientais do projeto, praticamente todos os participantes criticaram a criação da QE 60 da forma como foi idealizada, principalmente a alta densidade populacional prevista. As explicações dos técnicos representantes da Terracap, da Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação (Seduh), da Terracap e da empresa Geo Lógica, contratada para elaborar o projeto, não convenceram os participantes, que manifestavam seu descontentamento assim que a exposição ia acontecendo.
“A criação dessa quadra como proposta é um absurdo. Vai promover um caos na parte sul do Guará, como o aumento exagerado de pessoas e veículos sem infraestrutura para tanto. A cidade acabou de receber as quadras 48 a 58, para onde vão chegar cerca de 9 mil novos moradores. Não haveria necessidade de se criar tantas habitações por enquanto no Guará”, protesta a prefeita comunitária da QE 46, a quadra mais próxima da futura QE 60, Célia Caixeta. “Há 25 anos luto pela ocupação da área com uma escola técnica, uma faculdade pública e um centro de saúde, que não serviriam apenas à população do Guará, mas também as de Candangolândia e Núcleo Bandeirante. Estão nos empurrando de goela abaixo, porque essas audiências públicas são apenas para “inglês ver”, completa a líder comunitária.
Para o ex-administrador regional do Guará e morador da QE 44, outra quadra a ser afetada pelo projeto, Wágner Sampaio, “enquanto a população está preocupada com a saúde de seus familiares e acompanhando as datas de vacinação da Covid-19 e preocupados com a volta às aulas dos filhos, o governador Ibaneis Rocha segue a cartilha do Ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, de facilitar a “passagem da boiada”. Não há demanda no Guará para mais moradias dessa faixa de renda, uma vez que existem diversos lotes vagos na região central e as QEs 48 a 58 nem concluídas estão. O GDF inventa uma nova quadra com previsão de mais de 8 mil moradores sendo que não houve alargamento das vias, construção de escolas, terminais de ônibus e aumento do efetivo policial na região, entre tantos serviços públicos necessários”, afirma. “Puro genocídio vegetal. Vão matar várias espécies de animais, árvores do cerrado, várias nascentes há 300 metros de onde estão querendo desmatar para beneficiar ocupação urbana, sem necessidade”, completa Danilo Albuquerque Lamarca, um dos líderes do movimento contra a criação da QE 60.
O tamanho da ocupação
A QE 60, que vai ocupar o terreno que pertencia à Telecomunicações Aero-náuticas S/A (Tasa), uma subsidiária da Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero), vai abrigar uma população de cerca de 8 mil pessoas (7.990 de acordo com a previsão do projeto), em 103 lotes, sendo 80% destinados a residências e 20% ao comércio. Serão cerca de 3 mil apartamentos. O projeto prevê quatro praças, quatro grandes lotes (entre 1.500 a 2 mil metros quadrados) para comércio e indústria, e outros dois lotes de 1.500 metros quadrados para instituições ou serviços públicos, 24 lotes de uso misto (comércio e residência). Os prédios terão no máximo seis andares.
Após a audiência pública e a liberação da licença ambiental, a Terracap vai concluir o projeto técnico para a licitação dos terrenos. A previsão da empresa é que os primeiros terrenos sejam ofertados ao mercado no segundo semestre de 2022. Parte dos terrenos, em quantidade ainda não informada, será destinada ao atendimento da lista de espera da Companhia de Desenvolvimento Habita-cional (Codhab).
A área da QE 60 era cobiçada pelos movimentos sociais para moradia de baixa e média renda, principalmente as cooperativas habitacionais, mas a Terracap garante que a área não é de “interesse social”, portanto, poderá ser vendida à iniciativa privada através de licitação. “O governo entende que já atendeu à demanda dos movimentos sociais no Guará, com a destinação de 805 lotes às cooperativas habitacionais nas QEs 50 a 56. Precisamos agora ofertar opções a quem está numa faixa de renda acima e tem interesse em morar na cidade”, afirma o diretor de Comercialização da Terracap, Júlio César Reais.
Estudo mostra os impactos ambientais
O estudo ambiental da QE 60, apresentado na audiência pública desta terça-feira, foi elaborado pela empresa Geo Lógica Consultoria Ambiental. Coube a engenheira ambiental e coordenadora do estudo, Paula Romão de Oliveira França, a apresentação do relatório.
De acordo com engenheira, o local, que atualmente está com área degradada, vai ser melhor utilizado, tanto do ponto de vista comercial, quanto habitacional. “Em geral, levando-se em conta todos os aspectos pesquisados, a equipe técnica entende pela viabilidade ambiental do parcelamento, estando apto para ser ocupado”, afirmou Paula Romão.
A audiência pública, transmitida ao vivo, foi acompanhada por 37 pessoas, simultaneamente, no YouTube. Ao final da exposição, abriu-se espaço para questionamentos dos interessados. Quem teve dificuldades de acesso à Internet e a equipamentos eletrônicos, também puderam acompanhar as argumentações no Centro de Ensino Fundamental 10, ao lado da QE 46
Para aqueles que não puderam acompanhar audiência, foi fixado o prazo de dez dias para o encaminhamento de contribuições via e-mail: licenciamento.ibram@gmail.com ou pelo WhatsApp 99248-9698.