A avenida Central do Guará II está em obras. Financiada por construtoras privadas, uma nova ciclovia e uma ciclofaixa vão percorrer toda a extensão da avenida. Uma praça também será construída atrás da 4ª Delegacia de Polícia, em frente à QE 15. A obra é resultado da compensação urbanística que as construtoras devem à cidade por terem levantado os grandes prédios residenciais na orla do Guará II.
Para a realização da obra, foi feito um Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV) foi realizado pela Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação do DF, aprovada por uma comissão formada por diversos órgão do Governo do Distrito Federal, como Secretaria de Obras, Detran, Novacap, Ibram, Secretaria de Mobilidade e o Conselho de Planejamento do Distrito Federal.
“A reformulação da Avenida Central, criando uma infraestrutura cicloviária que conecte a estação do metrô Guará ao eixo estruturados foi identificada no Projeto Mobilidade Ativa no Entorno das Estações do metrô, tendo sido referendada no Plano +Bike elaborado em 2018 pela Secretaria de Mobilidade, com o intuito de complementar a rede cicloviária” Memorial Descritivo do projeto aprovado
A obra
A parte mais significativa das intervenções é caminho específico para bicicletas. No trecho entre a Estação Guará do Metrô e a Delegacia, uma faixa da pista está sendo transformada em um estacionamento e uma ciclovia, ao lado da calçada. Como os carros já usavam uma faixa para estacionar, não haverá prejuízo ao trânsito do local.
Já no trecho maior, entre a delegacia e o Edifício Consei, onde se realiza a Rua do Lazer, a pista onde os carros já ficam estacionados será definitivamente transformada em estacionamento, regularizando a situação do local. No centro da avenida será instalada uma ciclofaixa, no asfalto, com separadores de meio-fio. Todas as árvores serão mantidas.
No terceiro trecho, entre o edíficios Consei e Pedro Teixeira, apenas uma ciclovia será construída paralela à calçada. A pista permanecerá como está. Como ainda há poucos prédios nesse trecho, são necessárias menos intervenções nas vias.
O estudante de economia Pedro Morgado usa a bicicleta para se deslocar pela cidade. Morador de um dos condomínios da avenida central, teme por sua segurança quando passa por ali. “Só temos duas alternativas, pedalar pela pista, que é até tranquila na maior parte do dia, nas no início da noite fica bem perigosa, ou pela calçada. Pela calçada é ainda mais perigoso, pois há muitas pessoas, principalmente idosos, passeando com seus cachorrinhos, ou saindo dos prédios. É mesmo preciso uma pista apenas para as bicicletas”, avalia.
Importância da ciclovia
Tornar o Guará adequado e seguro para o transporte por bicicleta traz inúmeros benefícios aos seus moradores. Ofertar mais um modal eficiente de transporte, ajuda a reduzir os acidentes, cria espaços mais agradáveis, gera acessibilidade e reduz o trânsito. Incentivar o uso da bicicleta em deslocamentos locais é uma tendência em todo o mundo e uma atitude fundamental para tornar o Guará mais inteligente e adequado à convivência. Além disso, o uso da bicicleta reduz a emissão de gás carbônico e de outros gases tóxicos. Por isso que as cidades que se preocupam com o meio ambiente e com a qualidade de vida de seus habitantes tem a ciclovia como um de seus projetos principais.
Os Países Baixos (Holanda, Bélgica e Luxemburgo) têm mais de 450 habitantes por quilômetro quadrado, um dos países mais povoados do mundo, e nunca tiveram um apagão viário, porque há muitos anos, e mais especificamente a capital da Holanda, Amsterdã, concentra seu sistema de transporte nas bicicletas. Hoje, praticamente metade da população de Amsterdã realiza seus deslocamentos através de bicicleta. São mais de 20 mil quilômetros de ciclovias espalhadas pelo país.
Mas, essa curta ciclovia no Guará não vai resolver o problema, ainda que seja um começo. O governo do DF mantém um programa continuado, o Mobilidade Ativa, que prevê, além da construção de ciclofaixas e ciclovias, a integração com outros modais de transporte, paraciclos e bicicletários espalhados pela cidade, bicicletas compartilhadas e outras iniciativas para mudar a maneira com que as pessoas se deslocam por aqui.
Polêmica
Mas nem todos estão felizes com a construção. Lideranças comunitárias alegam que as obras são irregulares, que vão prejudicar o trânsito, e até que servem apenas para beneficiar políticos ou empresas.
A confusão foi formada pela falta de informação. O governo falhou em comunicar aos moradores do Guará o que estava acontecendo ali, quem era o responsável pela obra e como seria feita. A Administração Regional do Guará alegou não ter conhecimento sobre as intervenções na Avenida Central, o mesmo aconteceu com a Secretaria de Obras e a Novacap, quando consultadas pelo Jornal do Guará.
Os moradores alegam nunca terem sido consultados. O fato é que, de acordo com documentos enviados ao JG pela Secretaria de Desenvolvimento e Habitação (Seduh), no dia 27 de setembro de 2011 ocorreu uma audiência pública no Auditório da Administração do Guará sobre o assunto. Sem publicidade, apenas presidentes de cooperativas habitacionais apareceram. Na época, eles reivindicavam os lotes nas novas quadras do Guará, as QEs 48 a 58, o que mudou completamente o foco do encontro. Ainda assim, o governo considerou que foi cumprida a obrigação legal de realizar uma consulta à população. Antes disso, no dia 15 de setembro de 2011, o Conselho de Planejamento (Conplan), em sua 96ª reunião ordinária, aprovou o Estudo de Impacto de Vizinhança e da Avenida Central do Guará II teria sido aprovado pela Comissão Multisetorial instituída pelo 32.921/2011.
Quase dez anos depois, no dia 14 de junho de 2021, a Comissão Permanente de Análise de Estudo Prévio de Impacto de Vizinhança deu “anuência à empresa Hesa 20, compromissária do Grupo 2 do TC 02/2020, para que execute a obra de implantação do Trecho 01 do Projeto SIV 076/2018”. Essa comissão é formada por diversos órgãos do GDF, que fiscalizam e planejam a infraestrutura urbana, o meio ambiente e o trânsito. Portanto, alegações de que órgãos de trânsito não estariam de acordo com as intervenções não procedem, embora tenha faltado publicidade às ações.
Mas, ao falhar em comunicar os moradores e os próprios órgãos correlatos, como a Administração do Guará, o Governo do Distrito Federal ajudou a criar muitos questionamentos e suspeitas. Afinal, o mistério por trás da obra na principal avenida do Guará não é justificado.
Documentos do projeto:
folha_00000001_1__suporte_MDE_076_18
Decisao-CPA-EIV-05-2021-SIV-076-2018-Hesa-20-SODF
PALAVRA DO ESPECIALISTA
“As cidades que possuem redes integradas de ciclovias e calçadas são mais convidativas ao convívio”
O projeto em andamento na Avenida Central do Guará II é adequado à sua finalidade?
A implantação da ciclovia da Avenida Central do Guará II está de acordo com as diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana (Lei nº 12.587, de 3 de janeiro de 2012) que estabelece:
II – prioridade dos modos de transportes não motorizados sobre os motorizados e dos serviços de transporte público coletivo sobre o transporte individual motorizado.
Ademais, a avenida é uma importante via que conecta pontos de interesse no Guará, como o metrô, e que possui demanda de ciclistas e carece de infraestrutura cicloviária.
Qual a importância do projeto para a cidade? Vai contribuir com a mobilidade?
O projeto é fundamental para a promoção da Mobilidade Urbana de Baixo Carbono e Segurança no Trânsito, pois contribui para a integração entre a utilização da bicicleta e o uso do transporte público (metrô), ao conectar as áreas residenciais do Guará II à estação do metrô. Além disso, favorece a segurança da utilização da bicicleta em viagens curtas e médias na cidade. No entanto, vale ressaltar que a implantação da infraestrutura cicloviária por si só não alcançará os objetivos de desenvolvimento sustentável, caso não haja a adesão da população ao uso da bicicleta (inclusive em viagens ao trabalho/estudo). Por isso, é essencial uma mudança de comportamento em que as pessoas possam reduzir o uso do carro/moto e priorizem os modos ativos (a pé e bicicleta).
Alguns moradores alegam que o projeto vai piorar o trânsito na via, com a redução de uma faixa. Qual a sua opinião?
O paradigma da ampliação das faixas de rodagem como medida para melhoria das condições de tráfego é ultrapassado, pois o aumento do número de faixas cria incentivos à utilização do automóvel, que consequentemente resultará em maiores índices de congestionamentos. Desta forma, cria-se o ciclo vicioso do congestiomento. Por isso, os gestores públicos devem adotar o conceito de “ruas completas”, em que as pessoas e os diferentes meios de transportes compartilham de forma harmônica o espaço urbano. No Brasil, observa-se que boa parte dos espaços são priorizados para o carro e as consequências disso são os congestionamentos e os acidentes de trânsito.
Qual a importância em investir em ciclo faixas e calçadas? Como isso muda a relação do cidadão com a cidade?
As cidades que possuem redes integradas de ciclovias e calçadas são mais convidativas ao convívio comunitário e podem ter melhores índices de mobilidade urbana, segurança no trânsito e bem-estar social. Para isso, são necessárias ações complementares que não dependem apenas da infraestrutura, como a educação para o trânsito e participação social no planejamento das cidades.
Você, que mora bem em frente à obra, tem acompanhado o seu desenrolar?
Acredito que a obra poderá sofrer atrasos devido às condições climáticas atuais, além disso, vejo muitos pessoas desorientados sem entender do que se trata a obra e sobre sua importância. Por isso, acredito que os gestores públicos deveriam melhorar a comunicação com a população afim de esclarecer as potencialidades e os benefícios que a implantação da ciclovia trará para a população do Guará.