Guará foi de esquerda até 2014

Virada aconteceu em 2018 e coincidiu com o crescimento socioeconômico da cidade e o enfraquecimento do segmento sindicalista

Nesses 36 anos de emancipação política do Distrito Federal – a primeira eleição aconteceu em 1986 – e de 32 anos da Câmara Legislativa – elegeu seus primeiros deputados distritais em 1990 -, o eleitorado guaraense sempre preferiu votar na esquerda. Essa tendência se confirmou em todas as eleições realizadas no Distrito Federal até 2014, mas foi quebrada em 2018. A explicação mais lógica é que até então a maioria dos moradores da cidade era de servidores públicos, principalmente bancários e professores, que sofriam forte influência dos seus sindicatos profissionais, enfraquecidos com a queda do imposto sindical obrigatório. E, também, pela chegada de uma leva significativa de novos moradores, atraídos pelo boom imobiliário nos últimos dez anos em Brasília e no país.
Comecemos nossa análise pelas eleições de 1990, quando foi eleita a primeira bancada de deputados distritais da Câmara Legislativa. Na primeira eleição de Joaquim Roriz para governador – ele havia sido indicado pelo presidente José Sarney em 1986 – até mesmo o obscuro Carlos Saraiva e Saraiva, lançado pelo PT, conseguiu medir forças com o ex-governador biônico no Guará. Aliás, foi a única cidade do DF em que Saraiva praticamente empatou com Roriz – em todas as outras a diferença foi muito acima. A tendência do voto guaraense na esquerda se estendeu aos candidatos ao Senado, Valmir Campelo Bezerra, que fazia dobradinha com Roriz, e Lauro Campos, do PT. Se dependesse do voto guaraense, o petista teria sido eleito, porque foram apenas o Plano Piloto e o Guará que deram votação a ele acima de Valmir Campelo. Para deputado federal, o comunista Augusto Carvalho foi, disparado, o mais votado no Guará. A cidade foi a única do DF em que o petista Lula venceu Fernando Collor, o “caçador de marajá”, por mil votos a mais, diferença considerável para um colégio eleitoral de 53 mil votos da 9ª. Zona Eleitoral na época.
A grande esperança da chamada direita ou centro no voto guaraense estava representada nas candidaturas a deputado distrital, por sinal, da primeira bancada da Câmara Legislativa que seria eleita, mas, novamente a esquerda foi a preferida do morador da cidade. Nem mesmo a visibilidade dos ex-administradores regionais Francisco Brandes e Divino Alves conseguiu superar essa tendência – os mais votados na cidade foram os esquerdistas Carlos Alberto Torres, Lúcia Carvalho e Pedro Celso, os dois últimos do PT, que foram eleitos.

Em 1994, pela terceira vez consecutiva, o guaraense preferiu os candidatos da esquerda, a começar por Lula, que recebeu 11% a mais de votos na cidade do que o presidente eleito Fernando Henrique Cardoso. Para o governo do DF, Cristovam Buarque (PT) recebeu 8% de votos a mais na cidade em relação a Valmir Campelo (PTB). Lauro Campos, do PT, ao Senado, e, novamente, Augusto Carvalho (PPS), à Câmara dos Deputados receberam a maioria dos votos da 9ª Zona Eleitoral. Pelo menos essa tendência esquerdista ajudou a eleger os primeiros representantes da cidade na Câmara Legislativa, Cláudio Monteiro, do PPS, Lúcia Carvalho e Cafu, do PT. Na época, os três eram moradores do Guará. E Carlos Alberto Torres, do PPS, voltou a ter expressiva votação do guaraense, a maior proporção entre todas as zonas eleitorais do DF, embora não tenha sido eleito senador.
Em 1998, Lula voltou a ser mais votado no Guará do que Fernando Henrique Cardoso, com diferença de 11% a mais para o petista. Para o governo do DF, Cristovam Buarque, do PT, obteve 47% dos votos guaraenses, contra 32% de Roriz e 14% de Arruda. Para senador, a esquerdista Arlete Sampaio foi a preferida de 39,8% dos guaraense, contra 39,5% de Luis Estevão. Para deputado federal, pela primeira vez um candidato de direita ou centro obteve maioria na cidade, e esse feito coube a Jofran Frejat, com 6.675 votos, mas seguido de perto por Agnelo Queiroz, com 5.764 votos, representante da esquerda. Para a Câmara Legislativa, o guaraense preferiu votar em Alírio, então filiado ao PPS, que foi eleito pela primeira vez, com 4.530 votos na 9ª Zona Eleitoral. A tendência esquerdista da população guaraense se confirmava na votação dos cinco mais votados na cidade, na ordem Alírio Neto, Cláudio Monteiro, Maninha, Lúcia Carvalho e Rodrigo Rollemberg.

Esquerda faturou no Guará em 2002

Em 2002, a esquerda deitou e rolou no Guará. Para quase todos os cargos, os candidatos esquerdistas receberam a maioria dos votos na cidade, com exceção de Arruda para deputado federal. O banho começou pelos candidatos à Presidência da República, quando Lula foi votado por 41.592 contra 13.531 de Ciro Gomes, 12.129 de Garotinho e 11.844 de José Serra. Para o Senado, Cristovam Buarque, do PT, recebeu 46.291 votos, contra 32.237 de Paulo Octávio, do PP, e incríveis 27.623 votos ao desconhecido Fredo, do PCdoB, na 9ª. Zona Eleitoral. Para o Governo do DF, Magela superou Roriz na cidade, por 36.150 a 29.997 votos, seguidos de Rollemberg, outro de esquerda, com 5.562 votos. Arruda, enfim, quebrou essa hegemonia da esquerda no Guará, ao ser o mais votado pelo guaraense com quase 18 mil votos, seguido de Tadeu Fillippeli, com pouco mais de 10 mil votos, e de Agnelo Queiroz, do PCdoB, com quase 10 mil votos. Para a Câmara Legislativa, Alírio confirmou o favoritismo, ao obter a maior votação no Gaurá para deputado distrital no Guará, com 5.389 votos, embora não tenha sido eleito por causa do quociente eleitoral, mesmo tendo ficado entre os 10 candidatos a distrital mais votados. Depois de Alírio, o candidato de centro Izalci Lucas, do PFL, conseguiu 3.530 votos, seguido de Arlete Sampaio, com 2.751 votos na cidade.
A partir de 2006, a tendência esquerdista começou a perder força entre o eleitorado guaraense, mas ainda muito pouco. Lula, que concorria à Presidência da República com Geraldo Alkmim, teve mais de 46 mil votos (48%) dos votos guaraenses, contra 40 mil (41%) do ex-governador paulista. A esquerda foi a preferida também para o Senado, com Agnelo Queiroz (50,5% dos votos), contra Joaquim Roriz (com 43,2% dos votos guaraenses), mas perdeu espaço para a votação à Câmara dos Deputados, em que Izalci Lucas, do PFL, alcançou 9.281 votos do morador da cidade, contra o segunzzzzzzdo colocado, da esquerda, Augusto Carvalho (PPS), até então o recordista de voto no Guará, que obteve 7.573 votos aqui. A derrota da esquerda foi maior entre as candidaturas ao Senado, com mais de 36 mil votos (44%) dados a Arruda, contra 21 mil (25%) a Maria de Lourdes Abadia e 20 mil a Arlete Sampaio (24%). Para deputado distrital, Alírio foi o preferido do morador do Guará, com 5.968 votos, o recorde da 9ª Zona Eleitoral, não por ser de esquerda, mas por ter sido administrador regional com a melhor avaliação até então e pelas expressivas votações anteriores. Depois dele, Paulo Tadeu, do PT, recebeu 2.248 votos, e Chico Leite, também do PT, 2.097 votos na cidade.
Em 2010, a candidata esquerdista Marina Silva superou os 40 mil votos no Guará, contra Dilma Roussef, que seria eleita presidente da Pública, com 28 mil votos aqui. A tendência esquerdista se confirmou com a votação de Agnelo Queiroz, com mais de 43 mil votos na cidade, contra 23 mil de Wesliam Roriz, seguida de Toninho do PSOL, com 15 mil votos. Para o Senado, os dois mais votados na 9ª Zona Eleitoral foram Cristovam Buarque, com 51 mil votos, seguido de Rodrigo Rollemberg, com 46 mil votos, os dois de partidos esquerdistas, seguidos de Alberto Fraga, do PFL, com 30 mil votos. Reguffe, do PDT, foi o deputado federal mais votado no Guará, com 21 mil votos (24%), depois Izalci, do PR, com 8,6 mil. Paulo Tadeu, do PT, que havia sido o segundo deputado distrital mais votado no Guará em 2006, abaixo apenas de Alírio, foi o terceiro colocado na cidade, com 8,8 mil votos. Erika Kkay, do PT, foi a terceira colocada, seguida de Roberto Policarpo, também do PT e morador da cidade, na quarta colocação. Alírio voltou a ser o mais votado pelo guaraense, com 6.619 votos, o dobro de Chico Leito, do PT, com 3.543 votos, seguido de Arlete Sampaio, do PT, com 1.791 votos, confirmando a tendência esquerdista na votação do guaraense.
Em 2014, a esquerda voltou a apresentar supremacia no Guará, quando Rodrigo Rollemberg alcançou 46% (42 mil votos) contra 28% de Jofran Frejat (25 mil votos) e Agnelo Queiroz, do PT, com 17 mil votos (19%) dos votos guaraenses para o Governo do DF. Para o Senado, Reguffe, que circula entre a esquerda e o centro, obteve no Guará a maior média de votos (59,75%) de sua campanha, que teve média de 57,61% em todo o DF. Depois dele, o guaraense destinou 18,9% dos votos a Gim Argelo, e 16,65 % a Geraldo Magela. Gim, neste caso, quebrou em parte essa tendência esquerdista do guaraense. Como era esperado, o morador do Guará preferiu votar mais na esquerda para a presidência da República, destinando 42% (43 mil votos) a Dilma Roussef, depois 35,4% a Marina Silva (33 mil votos) e 33% a Aécio Neves (31 mil votos). Já para deputado federal e deputado distrital, a votação do guaraense foi mais centrada no defesa da cidade do que na ideologia partidária, principalmente em Rodrigo Delmasso, único deputado distrital guaraense eleito, e Alírio Neto e Izalci Lucas para a Câmara dos Deputados – Alírio, então no PEN, perdeu para o quociente eleitoral, mas Izalci, do PSDB, foi eleito. Alírio recebeu 14,4 mil votos no Guará dos 79 mil em todo o DF, seguido de Izalci com 6,3 mil dos 71 mil no total, depois Policarpo do PT e morador da cidade, com 4,3 mil dos 48 mil em todo o DF.

Esquerda perde espaço em 2018

A tendência esquerdista do voto guaraense teve queda significativa em 2018, iniciada com a votação para a presidência da República. Com surpreendentes 57.5 % (55.669 votos), Jair Bolsonaro foi, disparado, o presidenciável mais votado no Guará em 2018, com grande diferença dos esquerdistas Ciro Gomes (PDT), com 17,98% (17.410 votos) e também longe de Fernando Haddad, o candidato petista, que obteve apenas 10.552 votos guaraenses (10,91%). Para o Senado, o morador do Guará também foi mais conservador, ao preferir Leila e Izalci ao esquerdista Cristovam Buarque. Izalci conseguiu 16,82% dos votos da 9ª Zona Eleitoral, acima de Leila, com 16,44%. Para a Câmara dos Deputados, Flávia Arruda foi a mais votada pelo guaraense, com 6.695 votos (8,14%), seguida da petista Erika Kokey, com 6.104 votos (7,43%) e a direitista Bia Kicis, do PRP, com 5.906 votos (7,19%).
Para deputado distrital, a esquerda conseguiu a melhor colocação com Arlete Sampaio, do PT, em 7% lugar, contra Rodrigo Delmasso (PR), com 3.709 votos, dr. Carlos (Avante), 1.589 votos, Tabanez (Pros), 1.485 votos, Reginaldo Veras(PDT), 1.363 votos, Martins Machado (PRB), 1.324 votos, Wellingto Luiz (MDB), 1.140 votos, Arlete Sampaio (PT), 1.119 votos, Agaciel Maia (PR), 1.060 votos, Vânia Gurgel (PP), com 1.054 votos, e Chico Vigilante (PT), em 10º lugar, com 1.052 votos.