Com apenas 34 anos, ela teve uma carreira meteórica na corporação até assumir o comando da unidade guaraense. Além da atividade militar, Ive é também atleta e cantora – encantou o público que participou da sessão solene em homenagem ao aniversário do Guará ao cantar uma música de Elis Regina, de improviso
O dia dela começa às 8h e só termina por volta de meia-noite. São 16 horas para conciliar o papel de bombeira militar, atleta e cantora. E agora no comando do 13º Grupamento do Corpo de Bombeiros do Guará. A vida para a tenente coronel Ive Lorena Athaydes, 34 anos, é intensa. Além de comandar 110 militares – 87 homens e 23 mulheres -, ela gosta de cantar profissionalmente – já foi vocalista de três grupos que se apresentam na noite de Brasília, é atleta de futebol feminino e gosta de participar de maratonas.
Nascida em uma família de músicos, Lorena, como é conhecida, sempre gostou de cantar, mas, em tempos difíceis, precisou buscar uma forma de se sustentar antes de tentar seguir a carreira de cantora profissional. Foi assim que surgiu a segunda paixão: a corporação dos bombeiros. Aos 19 anos, foi aprovada no concurso de oficiais do Corpo de Bombeiros, em julho de 2007. À época, a ideia era ter um salário garantido para concretizar seu sonho: viver de música.
“Foi minha mãe que me forçou a passar nesse concurso dos bombeiros, não era algo que eu sonhava”, conta. “Não tinha como eu sonhar em trabalhar com música sem o dinheiro em casa. Mas, no dia em que botei meus pés na instituição, me apaixonei. O tempo foi passando e eu fui me envolvendo mais e mais”.
Em pouco mais de 14 anos na corporação, ela passou três anos como cadete – enquanto cursava a Academia do Bombeiro Militar –, seis meses como aspirante, três anos como segundo tenente, dois anos como primeiro tenente e três anos como capitã até chegar a tenente-coronel. Falta apenas a patente de coronel para completar a carreira de oficial militar, o que, pelo andar da carreira, não deve demorar muito.
Cantora profissional
A música, no entanto, sempre foi sua grande paixão. Mesmo com os afazeres militares, ela cantava até há dois anos em três grupos de samba e pagode de Brasília, o Cordel de Samba e os coletivos Essa Boquinha Eu Já Beijei e a banda Maria Vai Casoutras, que arrastam multidões no Carnaval de Brasília há muitos anos. Por causa da vida atribulada depois que assumiu postos mais altos no Corpo de Bombeiros do DF, ela teve que interromper essa atividade noturna, mas não desistiu da música e está preparando um lançamento solo em junho, de pagode e samba, com músicas autorais e de outras cantoras conhecidas, principalmente de Elis Regina. Além de cantar, e bem, ela também toca saxofone.
E isso nem é tudo. Desde 2015, Lorena também fazia parte do time de futebol feminino da Segurança Pública do DF – que, em 2017, foi a primeira equipe a representar o Brasil nos Jogos Mundiais de Policiais e Bombeiros (World Police and Fire Games), um evento esportivo bienal aberto a policiais, civis e militares, e bombeiros da ativa e aposentados de todo o mundo. As 12 atletas trouxeram a medalha de bronze de Los Angeles (EUA) e a major, capitã da equipe, foi a artilheira da competição. Em 2019, participou do time que foi vice-campeão do mundial de militares na China. Ah, é torcedora apaixonada do Flamengo.
Representatividade
Conciliar tantas atividades requer esforço e disciplina, mesmo solteira. As manhãs de Lorena, inclusive as de sábado, são dedicadas à atividades físicas – os treinos de futebol e musculação – aos ensaios e aulas com fonoaudióloga. À tarde é reservada para o expediente dos bombeiros, que vai das 13h às 19h oficialmente, as noites são para ensaios e apresentações e competições.
“Eu tento limitar minha agenda de eventos para os fins de semana e deixar o Corpo de Bombeiros específico para os dias de semana, mas também cumpro uma escala de serviços operacional, mesmo estando no expediente”, conta. “Então, eventualmente, eu posso pegar um serviço de 24 horas no fim de semana. Se o dia de serviço coincidir com um show, eu tento trocar com um colega. Mas tudo que envolve os bombeiros é minha prioridade, porque a música, apesar de me dar algum retorno financeiro, não é o meu sustento”.
“Por ser mulher, tudo que a gente se propõe a fazer é desafiador”, avalia. “A gente tem que lutar pelo nosso espaço em qualquer lugar, tanto na música quanto na minha corporação, que é militar. A gente sabe que nosso mundo como um todo ainda é muito machista. Por isso me dedico tanto, para poder ser exemplo para as mulheres que estão entrando agora na corporação, no mundo da música, onde elas quiserem estar”.