Uma das ativas e respeitadas líderes comunitárias do Guará está momentaneamente fora de cena. Quer dizer, por aqui. Há quase dois anos, Célia Caixeta, prefeita comunitária da QE 46, está passando uma temporada em Portugal, na cidade do Porto. Temporada que pode ser morada definitiva. Ou não, porque nem ela sabe se vai continuar por lá ou retornar para seu Guará ou sua Luziânia. O certo é que está planejando passar um bom tempo por lá, onde abriu um hostel, também conhecido como albergue, uma espécie de hospedagem econômica muito apreciada por jovens e mochileiros, com mais duas sócias.
A escolha por Portugal, especialmente pela cidade do Porto, não foi por acaso. Há 25 anos uma irmã dela mora lá e o filho Robert William também, há 18 anos. A ideia de mudar-se ou passar uma temporada lá foi sendo amadurecida nas visitas frequentes que fazia ao filho e à irmã. Contou também a necessidade de procurar um local que ajudasse na redução da hipertensão e dos problemas respiratórios que o clima de Brasília e do Centro Oeste ajudava a potencializar no seu organismo. Cada vez que ficava um tempo em Portugal, o coração e os pulmões agradeciam. “Deixei até de tomar os remédios contra hipertensão, que tomava há 25 anos”, conta.
Mas teve um terceiro fator que ajudou na decisão. Depois de trabalhar tanto tempo com a família Roriz – são conterrâneos de Luziânia – Célia se desencantou com a política após a saída da ex-deputada distrital Liliane Roriz do cenário ao desistir de sua reeleição em 2018, ao ser acusada de corrupção eleitoral e de falsidade ideológica por um ex-assessor.
Negócio de oportunidade
Numa das viagens ao Porto, onde costumava ficar até meses, Célia recebeu a proposta de uma ex-namorada do filho e de uma amiga dela para que montassem um hostel lá. Depois de encontrarem um imóvel, que precisou de muita recuperação, as três montaram o negócio, que, mesmo na pandemia, está indo bem. Célia garante que o retorno financeiro do investimento é suficiente para proporcionar a ela uma qualidade de vida bem superior à que tinha no Brasil, mesmo com as economias que juntou aqui e morando em casa própria. “E essa qualidade de vida inclui a segurança de pegar um ônibus sem medo de assalto, coisa que eu não fazia no Brasil há 35 anos, o metrô, andar pelas ruas sem a paranoia de correr o risco de ser atacada”.
Além da irmã, do filho Robert William, que integra a banda do ex-goleiro Helton, do Vasco da Gama e Porto, e tem sua banda própria também, Célia tem a companhia da filha Sabrina, 23 anos (a outra filha, Bruna, 30 anos, não quer morar lá) que montou uma clínica de beleza especializada em massagem, estética e embelezamento facial. Robert, além de músico, é representante de uma cerveja de origem angolana, que está fazendo muito sucesso no norte de Portugal. Mas, falta ainda o marido Ronaldo, que foi pego no meio da pandemia no Brasil e não pôde retornar a Portugal porque as fronteiras estão fechadas para os brasileiros até que a crise da Covid se arrefeça. “Ele odeia frio, mas resolveu me acompanhar nessa jornada. Virá assim que puder”, conta.
As faltas que sente
Falta, ela garante que sente mais da família, da fazenda e da chácara em Luziânia, para onde iam quase todos os finais de semana. “A saudade consigo matar em parte através da Internet, mas sinto falta do contato físico com meus familiares e meus amigos”, diz. E dos projetos sociais com idosos, crianças carentes que ajudava com a família há muitos anos. Do clima, nem tanto. “O frio daí é muito seco e o calor é preguento”, ri. “Sinto falta também do convívio com a minha QE 46, do grupo de amigos que fiz lá, mas continuo em contato permanente com eles”. Célia conta que continua liderando a Prefeitura Comunitária da quadra, por imposição dos próprios moradores. “Eles me consultam quando precisam de algo, indico os caminhos onde podem reivindicar, elaboro ofícios, enfim, continuo ajudando em tudo”, completa.
Até mesmo a administração do hostel não a impede de ter uma rotina com mais qualidade de vida. Como as três sócias se revezam, cada uma tem duas semanas de folga. “Aí aproveito para passear nas redondezas, visitar amigos, shoppings e ler. É uma rotina bem mais interessante da que tinha no Brasil”, garante.
Pretende voltar? Nem ela sabe. “Se encher o saco daqui, pode até ser. Por enquanto, não”, afirma.