PPP do Cave – Governo não desiste do projeto

Notícia que circulou em grupos sociais não é nova e se refere à suspensão temporária da licitação, em março, para o TCDF pudesse ouvir os argumentos contrários do Conselho de Cultura do Guará

Circulou durante a semana em alguns grupos sociais da cidade a notícia de que o Governo do Distrito Federal teria suspendido o processo de privatização do Complexo do Cave, o que provocou euforia no meio do movimento contrário à cessão do espaço à iniciativa privada. Mas a notícia não é nova e se baseia no mesma decisão do governo publicada no Oficial do DF do dia 18 de março, em que a Secretaria de Esporte e Lazer suspendia a licitação, que estava marcada para o dia 29 de março, atendendo à recomendação do Tribunal de Contas do Distrito Federal, que pediu tempo para analisar a argumentação do presidente do Conselho de Cultura do Guará, Rênio Quintas.

 

Na sua argumentação, o maestro Rênio Quintas reclama da inclusão do Teatro de Arena no projeto, o que, segundo ele, contraria a Lei Orgânica do Distrito Federal. No dia 1º de junho, os conselheiros do TCDF ouviram os argumentos do presidente do Conselho de Cultura do Guará, contra a continuação do processo de privatização do Complexo do Cave. Rênio buscou sensibilizar os conselheiros do TCDF ao alegar irregularidade na inclusão do Teatro de Arena no projeto, o que. segundo ele, afronta o Artigo 9 da Lei Orgânica do Distrito Federal, que veda a demolição ou transferência de um espaço público cultural sem que o assunto seja discutido com o Conselho Cultural da região e antes que seja viabilizado outro espaço público com os mesmos objetivos. Ele argumentou também que a comunidade teria se manifestado contra a privatização na única audiência pública promovida pelo governo para discutir o assunto, em 2017.

A suspensão refere-se apenas à licitação e não ao projeto, e foi tomada em março e não agora como chegou a ser divulgado

A audiência por vídeoconferência foi agendada pelo relator do processo, conselheiro Manoel Andrade, o Manoelzinho, depois que o plenário do Tribunal decidiu acatar a proposta do conselheiro Renato Rainha de ouvir Rênio Quintas e suspender a licitação do Cave. A contestação do Conselho de Cultura havia sido protocolada no Tribunal de Contas no ano passado, mas somente foi levada ao plenário após o lançamento do edital de licitação para a escolha do concessionário, publicado no Diário Oficial do DF no dia 21 de janeiro. O projeto havia sido liberado pelo TCDF à Secretaria de Esporte e Lazer, responsável pela licitação, no início de fevereiro, após o atendimento dos últimos questionamentos feitos pelo relator do processo.

Governo garante que privatização será mantida

Depois de ouvir Rênio Quintas, o conselheiro Manoel-zinho suspendeu a votação da continuidade do projeto, “para que os conselheiros pudessem analisar melhor os argumentos apresentados pelo presidente do Conselho de Cultura do Guará”. O relator, entretanto, informou à reportagem do Jornal do Guará que apenas adiou o julgamento para uma das próximas reuniões do TCDF, que acontecem às quartas-feiras, mas ainda não incluiu na pauta das votações.
Na argumentação apresentada aos conselheiros, Rênio sugeriu que os “equipamentos culturais, recreativos e esportivos, todos públicos, do Cave permaneçam na alçada pública e fiquem à disposição da população do Guará de forma gratuita e permanente e que o Distrito Federal faça sua manutenção periódica e rotineira para o bom funcionamento deles”. Além da inclusão do Teatro de Arena e do que considera desrespeito ao resultado da votação da audiência pública, o Conselho de Cultura também quer saber quais as contrapartidas sociais para o morador do Guará que não possa pagar pelo uso do espaço depois de privatizado.
A Secretaria de Esporte e Lazer informou à reportagem do Jornal do Guará que não pretende suspender a privatização do Cave e aguarda a liberação do processo pelo TCDF para decidir o que fazer. Caso o Tribunal proponha alguma modificação, o projeto será encaminhado à Secretaria de Projetos Especiais (Sepe) para análise. Caso o processo seja liberado sem alterações, será marcada uma nova data para a abertura das propostas, cumprindo apenas o prazo regimental da publicação do edital. A disposição do governo é de insistir na privatização, mesmo com a oposição de parte das lideranças comunitárias da cidade, principalmente à ligada ao meio cultural.
Técnicos que participaram da elaboração do projeto, ouvidos pela reportagem sob condição de anonimato, não acreditam que o TCDF venha a suspender a privatização definitivamente. “Há dois anos que o projeto vem sendo dissecado pelos conselheiros do tribunal e todas as exigências foram atendidas. E o Teatro de Arena é considerado um espaço poliesportivo e não cultural. E mesmo se fosse considerado cultural, ele não será extinto e nem vai mudar de lugar. Portanto, não há fato novo”, garante um deles. Outro técnico avalia que, se houver decisão contrário do tribunal, o governo faria apenas a adequação do projeto com a retirada do Teatro de Arena. “Lógico que teríamos que recalcular a viabilidade econômica para não inviabilizar o interesse na concessão, mas a decisão de privatizar o Cave continua por parte do governo”.
Em nota ao Jornal do Guará, a Secretaria de Esporte e Lazer informa que “cumpre o regulamento e os princípios licitatórios estabelecidos por lei, entre eles o da isonomia que visa o tratamento isonômico aos participantes da licitação, em respeito ao princípio da impessoalidade, e o princípio do procedimento formal o qual garante que os procedimentos adotados pela administração pública sejam formais, a fim de observar fielmente as normas contidas na legislação. Diante do exposto, a Pasta informa que não há contatos prévios com possíveis participantes do certame e o edital é um documento de acesso público”. Ou seja, o governo, pelo menos oficialmente, não tem conhecimento de interessados na concessão do Cave.

 

Pode faltar interessados

Alterações no projeto sugeridas pelo TCDF para divisão dos lucros futuros com o governo e ainda a possível retirada o Teatro de Arena podem tornar o projeto inviável economicamente. Principal interessado afirma que não quer mais o Cave

Mesmo que depois de ouvir os argumentos apresentados pelo presidente do Conselho de Cultura do Guará, Rênio Quintas, que alega irregularidade na inclusão do Teatro de Arena no projeto, os conselheiros do Tribunal de Contas do DF decidam pela continuação do processo, a licitação para a escolha do futuro concessionário do Complexo de Lazer e Esporte do Cave pode não ter proposta. De acordo com técnicos especializados no assunto, a inclusão de uma cláusula de divisão dos lucros com o Governo do Distrito Federal após o projeto implantado, exigido pelo TCDF, pode inviabilizar o retorno econômico do investidor. E se o tribunal acatar a sugestão do Conselho de Cultura do Guará e retirar o Teatro de Arena o interesse de investidores pela concessão do Cave pode reduzir ainda mais
“A conta não fecha. Depois de ter que investir cerca de R$ 30 milhões na reconstrução do estádio, do ginásio coberto e de todas as instalações, o investidor ainda terá que repassar 40% do lucro ao governo, além do que estiver pagando pela outorga. Da forma como o primeiro edital ficou, dificilmente alguém vai se interessar pela concessão. Eu, por exemplo, não tenho o menor interesse dessa forma”, afirma Luis Felipe Belmonte, até então o principal interessado na concessão do Cave, onde pretendia sediar seu clube de futebol masculino e feminino Real Brasília. A intenção de Belmonte era principalmente pelo estádio do Cave, que terá que ser todo reconstruído, e transformar as outras instalações em retorno financeiro para o investimento. “Só se aparecer um maluco que não se preocupe em recuperar o que investir ou tenha outras intenções”, reafirma o investidor, que foi o responsável pela elaboração do novo projeto do Cave, através de Proposta de Manifestação de Interesse (PMI) em 2015.

Sem viabilidade econômica

Belmonte critica as alterações sugeridas pelos conselheiros do TCDF, que, segundo ele, teriam desfigurado a viabilidade econômica do projeto. “Em qualquer privatização, o investidor precisa visar lucro. Da forma como ficou, o projeto não dará retorno. Os conselheiros foram na `cantiga da sereia´ e provavelmente vão espantar os interessados com as exigências”, completa, numa alusão ao movimento comunitário contra a privatização. Como a licitação é fechada e o resultado somente é conhecido no dia da abertura das propostas, a Secretaria de Esporte e Lazer garante que não tem como avaliar se há interessados na concessão.
Até o ano passado, comentava-se no meio esportivo que, além de Luis Felipe Belmonte, dois grandes clubes brasileiros tinham interesse na concessão do Cave, entre eles o Flamengo, que poderia criar aqui uma filial do clube, com o objetivo de buscar revelações no DF e dar “rodagem” e experiência a jogadores revelados no Ninho do Urubu que nem sempre tem a oportunidade no time de cima. O investimento de R$ 30 milhões seria um “troco” para o poderio econômico do rubronegro carioca, e representaria apenas um quinto do que o clube arrecadou com a venda do guaraense Reinier ao Real Madrid no ano passado, jogador revelado em Brasília. Neste caso, a intenção do clube seria adquirir ou fazer parceria com um clube que esteja disputando a primeira divisão do futebol brasiliense e disputar o campeonato local e mandando seus jogos no Estádio do Cave. Essa parceria, de acordo com as informações, poderia ser com o próprio Real Brasília, por causa da proximidade de Luis Felipe Belmonte com a diretoria do clube carioca, com quem já tem uma parceria informal – dois jogadores do clube brasiliense estão na divisão de base do próprio Flamengo.